22.7.14

Lento - Capitulo 27


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CONSIDERANDO QUE estava de volta ao hospital por volta das 10h da manhã, Demi poderia muito bem ter ficado lá. Se não tivesse ido embora, se tivesse se curvado num dos sofás desconfortáveis para esperar até a hora das visitas, talvez pudesse ter adiado o momento inevitável quando tivera de destroçar seu próprio coração. Porque era isso que fizera com cada palavra que falara para Joe nas primeiras horas da manhã.

– Eu sinto tanto – sussurrou ela, esfregando as mãos nos olhos cansados, enquanto olhava para o relógio na sala de espera do hospital. Seu pai tinha permissão de receber duas breves visitas por hora, começando às 11h. Demi foi a primeira da família a chegar, até poderia ter ido um pouco mais tarde. Mas para quê? Não era como se tivesse dormido ou feito qualquer coisa em casa que não pudesse fazer ali. Preocupar-se. Chorar. Lamentar.

Se seus medos pelo pai não tinham conseguido esvaziar seu cérebro ou impedido que seus olhos se fechassem na escuridão de seu quarto, então sua tristeza por ter mandado Joe embora de sua vida certamente fizera o trabalho.

Ele não tinha ajudado. Tentara dissuadi-la a fazer o que ambos sabiam que Demi realmente não queria fazer. Mas no final, com lágrimas escorrendo pelo rosto, ela admitira que estava cansada demais, assustada e confusa demais para raciocinar com clareza, e ele parara de insistir.

Deixando-a mandá-lo embora de sua vida.

Demi não era tola. Sabia que ele apenas partira porque também estava preocupado com o pai dela... e com o estado emocional de Demi. Se não fosse por isso, eles provavelmente ainda estariam na garagem no subsolo de seu prédio, discutindo sobre se Joe a amava de verdade ou não... e se continuaria amando-a.

E se ela lhe permitiria isso ou não.

Engraçado, a única coisa que ele nem sequer questionara tinha sido os sentimentos dela. Joe tomava seu amor por ele como algo totalmente certo, apesar deDemi nunca ter falado as palavras.

Isso não importava. Não havia como esconder seus sentimentos. De Joe ou de ninguém.

– Mas isso é hoje – lembrou a si mesma, enquanto olhava o relógio se aproximar das 11h.

Amanhã, bem, seu coração talvez provasse ser tão inconstante e arbitrário quanto o de todos em sua família. E Joe merecia mais do que isso. Muito mais.

Ela o amava demais para querer machucá-lo dessa forma. Mesmo se machucasse a si mesma todos os minutos do dia, pelo resto de sua vida.

– Você está aqui! – exclamou a voz de uma mulher.

Quase temendo que pudesse ser Deborah, Demi não pôde evitar um suspiro de alívio quando viu o rosto pálido de Sel. Levantando-se, envolveu sua irmã num abraço apertado, olhando, sobre o ombro dela, para o corredor, a fim de certificar-se de que sua irmã tinha ido sozinha. – Você está bem?

Sel assentiu.

– Bem.

Elas se separaram.

– Você não parece bem.

– Ora, é claro que eu estou bem. E você?

Demi meneou a cabeça.

– Mas papai vai ficar bom.

– Eu sei. –Sel enfiou a mão dentro de sua loja de grife e tirou um pacotinho de lenços de papel, oferecendo um para Demi, então limpando embaixo de seus próprios olhos. – Você pode imaginar?

Olhos inchados em minhas fotos de casamento?

Demi ficou boquiaberta.

– Do que você está falando?

Sel ergueu o queixo, os lábios tremendo, então endireitou o corpo.

– Bradley e a família dele querem proceder com o casamento esta tarde.

– Não, você não pode fazer isso!

– Eles dizem que é exatamente o que papai desejaria.

Eles provavelmente tinham razão. O que não tornava aquilo certo.

– Eles também apontaram, de maneira lógica, que já foi tudo pago... a comida está preparada, as flores estão no lugar. Dúzias de parentes já vieram de outras cidades. E o próprio cirurgião de papai disse que ele ficará bem. Ele apenas não será capaz de entrar comigo na igreja... desta vez.

Desta vez. De alguma maneira, Demi tinha a impressão de que Sel estava repetindo palavras que alguma outra pessoa lhe dissera. E ela subitamente queria bater naquela pessoa por colocar tanta pressão... e culpa... nos ombros delgados de sua irmã.

– Não se case com ele. – As palavras saíram da boca de Demi, sem que seu cérebro tivesse se envolvido na decisão. Sua irmã não lhe pedira conselho... mas ela o deu, de qualquer forma, incapaz de conter-se. – Você sabe que ele não a fará feliz. Sabe que não o ama.

– Eu amei meu primeiro marido, e amei outros homens desde então. Talvez amar alguém que eu não ame seja exatamente a coisa certa a fazer. – Ela passou uma mão cansada sobre o rosto, parecendo tão exausta quantoDemi se sentia. – É melhor assim, Mad. Eu simplesmente não nasci para me apaixonar e continuar apaixonada. Filha do meu pai, suponho.

Como Demi podia argumentar contra aquilo, quando mandara Joe embora de sua vida pela mesma razão?

Antes que pudesse falar mais alguma coisa, todavia, Selena olhou para o relógio.

– Vamos. Ela não pode nos criticar por entrar primeiro quando nem mesmo se importou de aparecer na hora.

Demi nem precisou perguntar de quem sua irmã estava falando. Eram 11h, Deborah não estava lá, e ninguém as impediria de ir para o lado de seu pai.

Chegando ao quarto dele e abrindo a porta, Demi prendeu a respiração. Ela esperara que ele parecesse à beira da morte. Pálido e exausto, fraco, cheio de fios e sondas e cercado por máquinas.

Ele estava cheio de fios e sondas e cercado por máquinas, e parecia cansado e pálido... mas não estava à beira da morte, em absoluto. Em vez disso, ao vê-las paradas junto à porta, ele sorriu e levantou uma mão, devagar.

– Minhas meninas.

Elas correram para o lado dele e choraram como bebês. As duas. A rainha do gelo e a rica mimada,

cada uma sentada de um lado do pai, segurando as mãos dele e soluçando.

O que logo deixou Jason Turner entediado.

– Basta. Eu estou bem. Parem ou vocês irão ensopar meus lençóis. Se as enfermeiras acharem que eu molhei esta cama, eu nunca mais poderei aparecer num evento de levantamento de fundos para um hospital.

Fungando, Demi conseguiu um sorriso.

– O que está acontecendo? Eu estou louco por notícias – disse ele, tentando soar normal, embora sua fraqueza fosse revelada pela suavidade da voz e pelas linhas de fadiga e dor no rosto dele. – Tudo está bem – disse Demi. – Tudo ótimo – concordou sua irmã – O casamento?

Sel o fitou, e Demi leu a angústia ali.

– Você vai dar prosseguimento a isso, não vai? Não ouse deixar este aqui... – seu pai gesticulou para seu próprio corpo fraco – impedi-la de se casar. – Então, olhando para o teto, em vez de para a noiva, acrescentou: – Se você quiser realmente se casar com ele, isto é.

Sel arfou em surpresa. Demi, que sabia que seu pai estava tendo dúvidas, não se surpreendeu.

– Se você não quiser, sinta-se livre para usar a fraqueza de seu velho pai como uma desculpa para sair de toda essa confusão.

Selena apenas fitou seu pai, os olhos enormes no rosto pálido, não falando uma única palavra. Seu pai não pressionou.

– Pobre Deborah, ela não está aqui?

– Eu tenho certeza de que ela estará aqui a qualquer minuto – disse Demi. – Nós apenas nos aproveitamos do fato de termos chegado um pouco antes de Deborah.

– Talvez.

– Ela estava preocupada – admitiu Selena, embora de forma relutante.

– Eu sei que estava. – Fechando os olhos e afundando mais a cabeça no travesseiro, ele murmurou:

– Não a julgue... eu não tenho sido muito gentil com aquela mulher.

Lembrando-se do que a madrasta delas tinha falado... sobre o marido encorajá-la a ter um caso...

Demi só pôde trocar um olhar significativo com Selena.

– Psiu, está tudo bem. – Sel acariciou o cabelo grisalho de seu pai.

– Eu não a amo, sabe? – Com os olhos fechados, as palavras não passavam de um sussurro, como se ele estivesse falando mais consigo mesmo do que com elas. – Eu não tenho certeza quem disse isso, mas é verdade. A única coisa pior do que estar num casamento sem amor, é estar em um onde existe amor de apenas um dos lados. Algo que eu já deveria ter aprendido a essa altura.

– Pare com isso. Ela sabia o que estava fazendo – murmurou Demi, mais preocupada com a saúde de seu pai do que com as emoções de sua madrasta. – Além do mais, você é capaz de amar, papai. Apenas olhe para nós. Não há dúvida, na mente de Selena ou na minha, de que você nos ama tanto quanto nós o amamos.

Um tipo diferente de amor... mas ela não permitiria que o pai mergulhasse em auto recriminação, não quando ele precisava se recuperar.

Suas palavras pareceram surpreendê-lo. Ele abriu os olhos.

– Ah, é claro que eu sou capaz de amar, querida. – As mãos frágeis deslizaram pelo cobertor fino do hospital, de modo que ele pudesse segurar uma mão de cada filha. – Eu amei muito.

E frequentemente.

– Esse é o problema, sabem? – acrescentou ele, os dedos se afrouxando, como se o esforço de apertar as mãos delas fosse grande demais. – Como muitas outras pessoas em minha família... sua avó, que viveu sozinha por décadas, meu irmão, sempre procurando por aquela que ele tolamente deixou escapar... eu estou à mercê de meu próprio coração. – Ele deu um tapa leve no peito. – O qual é, talvez, um pouco mais fraco do que eu imaginava.

– O que você está dizendo? – perguntou Sel, em confusão visível.

Ele sorriu para sua filha mais velha, que compartilhava seus brilhantes olhos azuis.

– Eu gostava de sua mãe, mas nós éramos jovens. Nenhum de nós entrou no relacionamento pelas razões certas.

Selena assentiu, concedendo o ponto. – Eu sei.

– E eu apreciei muitos relacionamentos com outras mulheres ao longo dos anos. – Então ele olhou para Demi e seus olhos umedeceram, como se lágrimas estivessem ameaçando. – Mas a verdade é que, nós, Turner, somos capazes de apenas um amor verdadeiro.

Demi arfou. Nunca ouvira seu pai falar desse jeito, nem uma única vez durante seus 28 anos. E embora, por um breve momento, tivesse se perguntado se a medicação o confundira, teve de reconhecer que o olhar dele era claro, a voz, apesar de fraca, continha muita convicção.

– Essa é uma benção e uma praga em nossa família, mas é verdade. Nós só conseguimos amar uma vez. Um grande amor, para nunca ser esquecido, nunca ser substituído, nem mesmo se nós acabarmos completamente sozinhos. – Ele estendeu o braço e roçou uma mão trêmula no rosto de Demi. – Você parte meu coração e o preenche, cada vez que olho nos seus olhos e a vejo aí.

E subitamente, ela entendeu o que seu pai estava dizendo. A verdade que ele nunca admitira antes.

Seu pai não era culpado de amar muito brevemente ou de maneira muito superficial.

A grande tragédia da vida dele era ter amado tanto que nunca pudera dizer adeus.

– Vocês duas estão condenadas, lamento informá-las. Portanto, fiquem alerta, ouçam ao seu coração – disse ele, com um suspiro profundo. – E quando encontrarem o verdadeiro amor, saboreiem cada momento, não percam um segundo desta benção. Eu encontrei a outra metade do meu coração e passei 24 anos tentando preencher o tempo, até que eu possa estar com ela novamente.

Lágrimas escorreram livremente pelas faces de Demi. De todos os momentos que ela lamentara ter perdido sua mãe, este era o mais intenso.

Seu pai pegou a mão de Demi novamente, fitando-a com olhos tristes.

– Você encontrou o homem errado, querida... de novo e de novo, tentando tão arduamente e esperando que cada vez fosse melhor do que a última. – Então voltou sua atenção para Demi. – E você, minha doce garota, fechou-se completamente, nunca se permitindo acreditar que algum dia encontrará o homem certo.

– Ah, papai – sussurrou Demi, seu coração doendo por ele com cada palavra que ele falava.

Havia, ela sabia, um presente que podia lhe dar, para ajudar a diminuir a preocupação de seu pai, talvez para ajudá-lo a se curar. Apenas um segredo... porém, o mais importante da vida de Demi. – Você está errado, sabia?

Ele meramente esperou.

– Eu já o encontrei – murmurou ela, então inclinou-se para dar um beijo na testa de seu pai. Ele a olhou, vendo a verdade ali.

– Eu fico tão feliz – sussurrou seu pai. – Tão, tão feliz. – Então ele adormeceu, parecendo confortável e relaxado, a respiração tranquila e regular.

Demi e sua irmã olharam para seu pai, então se entreolharam através da cama. A dor que seu pai sofrera durante os longos anos solitários devia estar escrita claramente no rosto das duas irmãs. Elas até mesmo lamentaram por sua madrasta, a mulher que tivera a esperança de preencher o vazio do coração dele, que, até o dia de hoje, estava de luto por Magdalena.

Uma enfermeira entrou, informando que o tempo delas tinha acabado. As duas se levantaram ao mesmo tempo, cada uma abaixando-se para beijar o rosto de seu pai, antes de saírem do quarto, juntas.

– Eu tenho de ir – murmurou Selena, a voz tendo perdido aquele tom de ansiedade... assim como da tristeza e culpa que ela vinha carregando desde que chegara lá esta manhã. – Tenho um casamento para cancelar, e um noivo para rejeitar.

Incapaz de conter um sorriso, Demi pegou a mão de sua irmã.

– E eu tenho três palavras para falar para um homem incrível.

O amor de sua vida. Demi não tinha mais uma única dúvida sobre isso.
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3 comentários:

  1. Simplesmente divino esse capítulo! Ainda bem que a Selena vai cancelar esse casamento! E GRAÇAS A DEUS A DEMI VAI ATRÁS DESSE HOMEM. POR QUE SE ELA NÃO FOSSE EU IA!!
    Continua ..
    Fabíola Barboza :*

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  2. Posta maais!!! To louca pra saber como a Demi vai atras do Joe aaaahhhh!!! Essa fic é DIVA!!

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  3. SIM DEMI, SIM!!!!!!!!!
    FALA QUE AMA O JOE LOGO, E O JOE CADE? ??

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