29.6.15

Lar da Paixão - Capitulo 5

Assim eles foram até a manhã seguinte.

Demi não fugiu mais, e Joseph não passou a noite toda acordado perguntando-se se ela ainda estava lá.

Ele chegou a pensar em ligar o alarme, para o caso de Demi abrir a porta da rua, mas depois resolveu o contrário. Ele não queria que ela se sentisse presa, e ele precisava confiar nela.

Demi disse que ficaria. Então, ele lhe concedeu o benefício da dúvida e, pela manhã, ela ainda estava lá.

Assim que acordou, ele a viu de pé, imóvel, no jardim, coberta da cabeça aos pés no seu roupão, admirando o mar calmo e tranquilo, e Joseph sentiu algo no peito que não que­ria analisar.

Ele apertou o controle da janela para "nuvens", uma coisa que nunca fazia, e depois de tomar banho e se vestir desceu para colocar a chaleira no fogo e a viu lá fora, com a cabeça ligeiramente inclinada para ver o céu.

— Bom dia — ele disse, e ela voltou para casa, os pés descalços sobre a grama molhada.

— Bom dia. Estava sentindo o ar do mar no rosto.

— Então, ficará por um bom tempo.

— Mas vale a pena, isso é lindo.

— Você dormiu bem?

— Sim, estava cansada.

— O dia foi difícil, ontem.

— Foi sim. — Ela fez uma pausa. — O jardim é todo cercado?

— Completamente.

— Então Pebbles não vai fugir se eu a deixar sair da casa?

— Só se os portões estiveram abertos, mas normalmente não estão. E se a deixar no jardim dos fundos, ela não vai poder chegar à parte da frente da casa. Ela ainda consegue pular? Há uma parede com uma porta junto à garagem, e outra parede do outro lado; ela não pode descer para a praia a não ser que o portão esteja aberto.

— Então ela pode passear pela sala e pelo jardim?

— Pode.

— Ela vai adorar. Ela costumava se deitar no telhado para pegar sol e ver os passarinhos, durante horas. Creio que há muito tempo não consegue pegar os bichos, mas ela gosta de apreciá-los mesmo de longe.

— Tenho certeza de que sim. Deixe-a sair, coitada, vai lhe fazer bem esticar as pernas.

Demi abriu um largo sorriso e se encaminhou para seu apar­tamento, deixando pegadas molhadas ao pisar no piso de pedra. Logo depois, Pebbles apareceu ao seu lado, olhando tudo com muita cautela, pronta para correr ao menor sinal de perigo.

— Chá ou café? — ele perguntou.

— Chá seria ótimo. Mas não era eu que devia estar prepa­rando o café da manhã?

— Você ainda não aceitou o emprego.

O silêncio entre eles se estendeu demais, e ele chegou a pensar que tinha estragado tudo, até que ela sorriu.

— Vou fazer o chá.

E ele respirou aliviado e sorriu também.

— Cuide da sua gatinha. Não estou certo se o café da ma­nhã tão cedo assim se enquadra nas suas funções — ele dis­se. E logo entrou em casa, cantarolando alegremente, mas sem querer saber o motivo de tanta alegria.

*****

— Qual é o horário da reunião com os advogados?

— Não tenho certeza. Talvez dez.

— Ah! — Ela consultou o relógio e mordeu o lábio. Pre­tendia passar suas roupas na noite anterior e separar algo para vestir, mas com toda aquela confusão...

— Qual é o problema?

— Todas as minhas roupas estão úmidas e malcheirosas. Eu tinha planejado lavá-las ontem à noite. Não posso ir a essa reunião vestida de jeans e camiseta.

— Tem alguma roupa de grávida?

— Tenho apenas algumas calças de moletom e camisetas. Minha calça antiga não cabe mais em mim, mas é a melhor roupa que tenho, e ela foi lavada ontem, graças a você.

— Posso perguntar a Emily se ela tem alguma roupa para lhe emprestar.

— Não quero dar trabalho. Vou usar minha calça jeans.

— Vamos fazer compras logo depois da reunião, está bem? Vou lhe comprar umas roupas.

— E isso vai ajudar muito quanto à minha fama de golpis­ta — ela falou baixinho.

— Bobagem, pense que é seu uniforme de trabalho.

Ela não comentou nada, mas seu rosto deve tê-la denun­ciado, porque ele riu.

— Não do tipo de empregada francesa. Mas você precisa­rá de roupas se vai me ajudar a receber convidados. Até por­que, você não vai ficar escondida na cozinha, não é mesmo? E depois, o teto do anexo era de nossa responsabilidade, por­tanto, você poderia reivindicar uma indenização.

Lógico. Inteligente da parte dele, e uma saída para o orgu­lho dela, apesar de estar em pânico quanto a receber os ami­gos. Receber quem, por exemplo? Tomara que não fosse a irmã dele. Mas Joe a observava, esperando por uma respos­ta, então não ia pensar nisso agora.

— Só poucas peças — ela concordou. — Até eu receber meu salário e poder comprar o que preciso.

— Certo. — Ele balançou a cabeça. — Então vamos nos aprontar. Quero sair dentro de meia hora, é tempo suficiente para você se arrumar?

Ela quase caiu na gargalhada. Ela levaria dois minutos para fazer o que era possível, ou dois dias, se fosse se arru­mar apropriadamente com corte de cabelo, sapatos decentes, maquiagem... A lista era longa, mas Demi não tinha tempo para pensar nisso agora. Parecia que estava deixando tudo para depois.

— Meia hora será suficiente.

*****

Ao chegarem ao escritório dos advogados, dois homens vie­ram recebê-los. Demi deduziu que fossem Harry e Nick. Ela reconheceu Harry da TV, onde ele aparecia fazendo reporta­gens pelo mundo, e Nick não lhe era totalmente estranho. Devia tê-lo visto pelo hotel antes da morte de Brian, só que nunca soube dimensionar sua importância.

Ambos pareciam sérios, ela pensou, e um pouco sem jeito na sua presença. Principalmente Harry, pois fora a sua espo­sa que a aborrecera na noite anterior. Ela tentou não pensar nisso, então endireitou os ombros e se aproximou deles com a mão estendida.

— Olá, sou Demi Lovato.

— Harry Kavenagh. Emily me encarregou de lhe pedir desculpas por ela.

Demi sorriu. Ela nem tinha certeza se Emily realmente tinha pedido tal coisa ao marido, mas resolveu lhe dar um crédito por isso. Apesar de ter pedido desculpas a Joe pelo telefone, na noite passada, e dizer que queria vir na casa dele, mas...

— Nick Barron — disse o outro, que sorriu para ela. — Lembro-me de você. Estava trabalhando na recepção quan­do conheci Brian Dawes.

— Na recepção e qualquer outro lugar — ela disse. — Sorte minha por saber fazer coisas variadas.

Todos acharam graça e riram, tornando o clima mais ame­no entre eles. Ao serem recebidos pelo advogado, ele se inte­ressou muito pela história de Demi.

— Então não há sinal do testamento, Srta. Lovato?

— Ian não encontrou, e eu também não sei onde Brian o guardou.

— E Brian não tinha advogado?

— Não sei dizer. Havia um sujeito chamado Barry Edwards. Talvez ele soubesse alguma coisa. Estava cuidando da venda, eu acho, mas não sei onde encontrá-lo. Brian não dis­cutia esses assuntos comigo.

— Conheço Barry Edwards. Estamos fazendo negócios com ele. Se existisse um testamento, ele o teria mencionado. Conversamos sobre a sua pretensão sobre a propriedade. Vou ter mais uma conversa com ele e ver se podemos escla­recer mais as coisas. Por enquanto, imagino que esteja satis­feita de sair do hotel e poder liberar a propriedade para os meus clientes.

Ela acenou a cabeça. Tinha se esquecido de como era es­tar em acomodações apropriadas, e a noite que passou foi como um sonho. Não tinha pressa nenhuma em voltar a viver um pesadelo.

— Não era seguro lá.

— Muito pelo contrário. O telhado desabou na noite pas­sada — Nick informou a todos. — Estive lá esta manhã. O colchão ficou soterrado debaixo de toneladas de entulho. Joe a tirou de lá na hora certa.

Joe respirou fundo ao seu lado.

— Meu Deus, foi mesmo?

— Foi sim. Estamos derrubando o resto que ficou antes que aconteça alguma tragédia.

Demi se sentiu mal. Suas mãos, instintivamente, segura­ram seu bebê, acariciando-a, com os olhos fixos em Joe. Ele a tocou no ombro de leve, e ela sorriu.

Não importava o que os outros pensassem, ele tinha feito a coisa certa, e ambos sabiam disso. Nick também sabia, tan­to que ele logo tratou de fechar a porta com tábuas para im­pedir que ela voltasse. O advogado pigarreou antes de falar:

— Bem, então, acho que o próximo passo é tentar reunir informações para essa sua reivindicação.

— Acho que não precisamos todos ficar aqui para isso, não é mesmo? — disse Joe, e todos concordaram.

— Os senhores querem acrescentar mais alguma coisa?

— Um contrato de trabalho — disse Joe. — Para prote­ger Demi e garantir seus direitos.

— Certo, farei isto também, depois lhe mostro. É só isso?

— Acho que sim — Joe disse. — Vamos voltar ao hotel, então, é, continuar conversando lá. Demi, quer nos en­contrar lá quando terminar aqui? Não fica longe. Estaremos no escritório.

— Certo. Qual é a porta?

— A porta interna, junto ao segurança.

Ela sorriu.

— Diga-lhe para me deixar entrar, por favor. Não somos muito amigos.

— Deixe comigo — disse Joe.

*****

— Ela é boa pessoa — Harry teve de admitir.

— Já havia lhe dito isso — Joe retrucou.

— É agradável, bem articulada, culta... — Harry fez uma careta antes de continuar: — Emily estava com medo de que você fosse se envolver com alguma ordinária interessada no seu dinheiro.

— E no dinheiro de Brian Dawes também; acho que ela usou a expressão mulher perigosa.

— Ai!

— Pois é.

— Emily precisa conhecer Demi.

— Concordo, só não sei se Demi vai querer. Se fosse comi­go, eu não ia querer. É um milagre ela não ter ido embora para nunca mais falar com nenhum de nós.

— Talvez seja por falta de opções — Nick sugeriu ao chegarem ao estacionamento do hotel. — Mas devo dizer que concordo com você, ela é muito simpática. Era fantástica quando trabalhava aqui. Sem ela, o hotel teria falido, porque a saúde de Brian era precária. Eu já estava negociando com ele antes de o filho voltar da Tailândia, e ele estava pronto para desistir. Só não vendeu antes porque tinha esperança de que um dos filhos assumisse a administração do hotel. Se eu soubesse que era ela que ocupava o anexo, teria falado diretamente com Demi, e poderíamos ter resolvido isso há muito tempo.

— Bem, agora já sabemos. Ela já está em segurança, e talvez possamos ajudá-la — Harry disse.

— Para começar, podia convencer a minha irmã de que ela não é uma mulher perigosa — sugeriu Joe secamente, e depois se dirigiu ao segurança na entrada: — A Srta. Lovato vem nos encontrar aqui. Por favor, não tente detê-la — ele disse e o sujeito fechou a cara.

— Srta. Lovato?

— A nossa inquilina. Ela me disse que vocês não são mui­to amigos.

— Só estava fazendo meu trabalho, senhor.

Joe se juntou aos outros.

— Vamos entrar.

*****

Era estranho voltar ali.

Demi entrou pela porta lateral e foi até a recepção, no gran­de hall de entrada. O silêncio do espaço acarpetado tinha dado lugar ao barulho ensurdecedor da obra e da demolição do anexo do outro lado do estacionamento.

Era um lugar familiar e ao mesmo tempo não era. Os ta­petes tinham saído, os móveis não estavam mais, exceto pelo balcão da recepção, e o local parecia uma concha, ecoando sons de perfuração e marteladas, um rádio tocando música pop brega e alguém cantando fora do tom.

Ela fechou os olhos e viu como o hotel fora um dia, com Brian sorrindo para ela do outro lado do velho balcão, com o sino de bronze sobre ele, e ela sentiu uma onda de pesar. Demi apertou bem os olhos até recuperar o controle para então voltar a abri-los. Adorava aquele balcão, com suas marcas feitas ao longo dos seus 150 anos de história. Pensou em quantas pessoas tinham se hospedado ali, nas histórias que teriam para contar. E agora tudo tinha acabado. Ela passou a mão sobre ele e saiu toda empoeirada.

Das cinzas às cinzas.

Ela engoliu em seco e se virou para dar de cara com Joe a observá-la.

— Você está bem? — ele perguntou baixinho, e ela ace­nou com a cabeça.

— Depois do enterro, nunca mais vim aqui. Está tão dife­rente agora.

— E vai ficar ainda mais diferente.

Demi já tinha se dado conta disso, ela precisava esquecer o passado.

— Então, o que planeja fazer? Vai destruí-lo e erguer um hotel moderno?

Ele sorriu.

— De forma alguma. Vamos restaurar o antigo hotel e construir o resto. Vamos transformá-lo num day spa e acade­mia, portanto, ainda será um hotel de certa maneira. Teremos diversos tipos de atividades e tratamentos de beleza, salas de massagens com fisioterapia e aromaterapia além de reiki shiastu. Teremos piscina, sauna a vapor e sauna seca. O lu­gar é muito grande, e está sendo subaproveitado. E não exis­tem espaços como este a quilômetros de distância.

— Preenchendo um nicho?

— Exatamente. Venha até o escritório e conheça o pai de Selena, George Cauldwell, nosso empreiteiro. Vou lhe mostrar as plantas, e depois vamos fazer compras. Como foi com o advogado?

— Foi tudo bem. Obrigada por ter nos deixado a sós e também por me apresentar a ele. Não sei se conseguirei o que quero, mas pelo menos tentei tudo o que era possível.

— Foi um prazer poder ajudá-la — ele disse, e seu sorriso provocou sensações estranhas nela.

Ou então era indigestão.

Mas Demi apostava que aquele sorriso tinha um significado.

*****

Nick estava ao telefone quando eles entraram, e parecia estar falando com Selena.

— Não vamos demorar muito. Acho que praticamente ter­minamos aqui, não é mesmo, George?

George sinalizou com o polegar para cima, e ele continuou: — Ele acabou de confirmar, portanto, sairei daqui em pouco tempo. Por quê?

Ele voltou a olhar para Demi e parecia pensativo.

— Eu não sei. Joe pretende mostrar as plantas a Demi e depois vai sair com ela para fazer compras. Ela perdeu todas as roupas. — Nick fez uma pausa, e eles ouviam a voz de Selena do outro lado da linha protestando. — Como você? Está bem, vou pedir que esperem.

Ele desligou o telefone e olhou para eles dois.

— Selena vai sair com as meninas. Ela disse que vai passar aqui, pois vai trazer umas roupas para você.

— Para mim? — Demi indagou, espantada.

— São roupas de gestante. Ela disse que é bobagem gastar dinheiro com roupas que usará por tão pouco tempo quando ela tem várias, e do seu tamanho. Já vai trazê-las aqui.

Droga. Joe não sabia se isso daria certo. Demi recusou logo de cara a oferta de Emily, mas talvez com Selena fosse diferente.

— Isso seria ótimo. Obrigada. Seria bom pegar uma peça ou duas emprestadas enquanto não compro as minhas próprias.

Emprestadas e por pouco tempo. Ela parecia desconfiar de todos eles, e Joe não a culpava por isso.

Interessante. Isso revelava mais um pouco dessa mulher que começava a intrigá-lo cada vez mais...

*****

Uns dez minutos depois, Demi já tinha sido apresentada a George, visto-os planos para o complexo de lazer e tinha um enorme saco de roupas que Selena havia deixado lá. Demi não a conheceu, pois Selena não chegou a entrar no hotel.

Que pena. Era uma chance para avaliá-la melhor, mas Nick tinha saído para pegar a sacola quando ela telefonou dizendo que estava no estacionamento, e agora ela e Joseph estavam a caminho de casa para experimentar as roupas.

Pouco depois, sozinha no seu apartamento, ela colocou todas as roupas sobre a cama. Calças elegantes de linho, um vestido de jérsei, calças jeans desbotadas, shorts jeans, cami­setas, jardineiras e várias batas, tudo com cheiro de roupa guardada.

Bonitinhas; e estariam perfeitas assim que ela lavasse para tirar o cheiro de mofo. Ela analisou as roupas, uma a uma.

O vestido tinha um corte bonito, assim como as calças e as batas, que seriam bem úteis. Havia até um sutiã. Um sutiã especial, com o suporte adequado, no entanto era grande de­mais. Jamais serviria, mesmo assim ela experimentou e, para sua surpresa, deu certinho. Não só coube, mas era confortá­vel, bonito e até sensual.

Incrível.

Ela experimentou uma calça preta de linho com um top, mais uma camisa de linho por cima e se olhou no espelho. Nossa. Parecia uma mulher respeitável. Não. Mais do que isso. Parecia pronta para sair na rua novamente de cabeça erguida, e depois do que viveu nos últimos meses isso foi o bastante para emocioná-la.

— Não seja estúpida — ela resmungou e pegou o vestido de jérsei.

Era lindo. Macio, leve e elegante. Ela olhou para a etique­ta e se espantou. Não era de uma loja barata, com toda a certeza. Não admirava ela ter se sentido tão bem nele.

E ela estava tão bonita vestida nele.

Havia uma sandália baixinha e, quando ela as retirou da sacola, junto veio um bilhete:

Espero que as roupas lhe sirvam. Sinto muito por tudo o que passou nas últimas semanas. Ligue para mim depois, e poderemos tomar um café e procurar mais algumas peças. Não desperdice dinheiro com esse tipo de roupa, tenho pi­lhas delas! Selena."

Demi engoliu em seco e sentou-se na cama. Um café entre amigas. Ela não fazia um programa desses havia anos; tanto tempo que nem se lembrava mais da última vez.

Joe bateu na porta.

— Demi? Tudo bem com você?

— Estou bem — ela disse, secando as lágrimas e se diri­gindo até a porta para abri-la. — São lindas. Foi muita gen­tileza de Selena. Ela me convidou para tomar um café. O que você acha? Devo ir? E o que devo usar? Eu não a conhe­ço, Não com esta roupa aqui, claro, que é arrumada demais. Tem alguma ideia?

Ela se virou e viu que ele a fitava como se ela tivesse co­metido alguma gafe terrível, e sua confiança começou a ruir.

— Hum, hum, acho melhor vestir meu jeans...

— Não! Está ótima assim. Desculpe-me, fiquei surpreso ao vê-la vestida assim. Você está... — Ele parou de falar e ficou olhando para ela por um tempo que parecia não ter fim, depois desviou o olhar. — Preciso voltar para o hotel. Se você quiser uma carona para ir a casa de Selena, eu posso levá-la, mas precisa ser agora. E vista alguma coisa bem in­formal, um jeans ou algo assim. Selena não se arruma mui­to quando tem de cuidar das crianças.

E Joe saiu do quarto de costas, Como se o quarto estives­se em chamas. Por quê?

Ela se virou para se olhar no espelho e aí ficou claro para ela. O vestido tinha um transpasse formando um decote em V, e com o novo sutiã o peito dela ficava mais bonito. Será que estava sensual?

Nossa.

Ela tirou o vestido com dedos trêmulos, experimentou a calça jeans com um top e achou que assim estava melhor. Agora só tinha de abrir a porta, procurar por Joseph e fingir que nada tinha acontecido.

Não que tivesse entendido o que tinha acontecido, mas ela ficou abalada mesmo assim e, fosse o que fosse, não preten­dia sentir aquilo de novo.

*****

Linda.

Ela ficou linda naquele vestido. Bonita e sensual, e muito feminina com os cabelos caindo soltos e brilhantes sobre os ombros; e ele ficou louco para tocá-los...

Joe saiu para o jardim e respirou fundo. Pebbles estava deitada na pedra tomando banho de sol, e ele a pegou cuida­dosamente e a trouxe para dentro.

Demi apareceu na porta, o cabelo preso novamente, num rabo de cavalo que depois ela retorceu e prendeu da mesma forma que Selena e Emily prendiam os delas. Vestia uma calça jeans e um top cor-de-rosa, e parecia até mais sensual do que antes.

— Está pronta?

Ela acenou com a cabeça.

— É melhor botar a gata no meu quarto — ela disse, e a pegou dos braços de Joseph, mas suas mãos se tocaram e ele sentiu como se tivesse sido queimado.

Demi se afastou, em seguida se virou e foi até o quarto, deixou a gata lá e voltou, cheia de pelo na roupa.

— Você está coberta de pelo da gata — ele disse. Cheia de pelo na barriga. E também nos seios. Será que eles estavam tão grandes assim ontem? Ele foi até a área de serviço e voltou com um rolo adesivo para retirar os pelos.

— Use isso. — Ele lhe entregou. Não poderia usá-lo sobre o corpo dela!

— Melhorou?

— Sim — ele disse sem se deter muito.

Joe colocou o rolo adesivo sobre a mesa, jogou a chave do carro para o alto e a pegou no ar.

— Telefonei para Selena, e ela está em casa. Ela a con­vidou para almoçar. Vamos logo.

*****

Demi se divertiu.

Selena a recebeu na porta, com um bebê encaixado no quadril.

— Olá, é um prazer conhecê-la — ela disse, olhando-a de cima a baixo. — Que bom que as roupas lhe serviram! Fico feliz.

— Ficaram ótimas, obrigada. Foi muito bom ter roupas que abarcassem minha barriga!

— Faça bom proveito. Entre, Demi. Esta é Lucie, e Maya está desenhando na mesa da cozinha.

Lucie devia ter uns 9 ou 10 meses, e Maya, uns 2 anos, ela imaginou. Maya olhou para ela a abriu um largo sorriso, e Demi elogiou seu desenho.

— Quer suco? Estou tomando suco — disse Maya, des­cendo da cadeira e se encaminhado para a geladeira.

Selena pegou a embalagem de suco da mão dela, antes que caísse, serviu dois copos e deu um para Demi.

— Esse top ficou perfeito em você. Nick me disse que você era mais ou menos do meu tamanho, mas eu não acre­ditei. Em geral, os homens não acertam essas coisas. Como ficaram as outras roupas?

— Maravilhosas. Não tive muito tempo para experimen­tar, mas acredito que ficarão todas ótimas. Experimentei um vestido preto, de jérsei, que ficou lindo.

— Ah, aquele... Nick sempre gostou muito dele. É bem confortável, usei bastante. Tenho outras roupas daquele estilo, mas eu não sabia o seu gosto, se era feminina ou prática.

Feminina? Ela nunca tinha sido desse tipo, mas teve von­tade de experimentá-lo.

Se bem que, pelo olhar de Joseph, talvez isso não fosse uma boa ideia.

— Vamos para o jardim. Preparei um piquenique para nós; vamos almoçar, meninas? Demi, será que pode levar Lucie para mim enquanto vou buscar a caixa térmica? Obrigada — ela disse ao lhe entregar o bebê.

— Oi, querida. — Demi sorriu, e a criança lhe sorriu de volta, exibindo três dentinhos.

E ela seria mãe. Nossa! Que coisa boa que ia lhe acontecer num ano com tantos problemas.

A casa era fabulosa, nada igual à de Joseph, mas era uma villa italiana acima da praia, e durante o almoço Selena lhe contou sobre a restauração da casa e a construção dos outros edifícios no terreno, dois anos antes.

— Joseph me contou que você é arquiteta — disse Demi.

— Eu era arquiteta, na verdade — ela corrigiu. — Agora só trabalho nas horas vagas, mas com quatro crianças é bem difí­cil. No futuro vou voltar a trabalhar, mas ajudei Joe com a casa dele. Foi divertido, meio corrido. Foi papai que fez a obra para ele e, como queriam se dedicar ao hotel, apressaram a obra um pouco e concluíram a casa em seis meses. Mas Joe até que gostou. Você conheceu meu pai hoje, George Cauldwell.

— Isso mesmo. Um senhor muito simpático.

— Ele é, sim, mas estou um pouco preocupada com ele. A obra é grande demais para papai, não é do tipo que costuma fazer, mas ele está adorando o desafio. Ele operou o coração dois anos atrás e teve de se afastar, mas agora voltou com força total. Estou tentando convencê-lo a não exagerar, po­rém, ele não me ouve. Nick o faz participar de algumas reu­niões, para obrigá-lo a ficar quieto, quando acha que ele esta cansado demais.

Demi podia imaginar Nick fazendo isso, ele parecia ser um bom sujeito. E Selena era um encanto. Animada e engraça­da; e as meninas, muito fofinhas.

Depois do almoço, Selena colocou as duas meninas para dormir enquanto elas escolhiam roupas de gestante.

Demi experimentou várias delas e mesmo se sentindo cul­pada sobre isso, ela estava começando a concordar com Selena de que era desperdício comprar roupas novas.

— Vou lhe devolver as roupas em pouco tempo — ela prometeu quando guardaram as peças numa sacola.

— Para quando é o bebê?

— Para o início de agosto. Daqui a oito semanas. Mal posso esperar para ver o rostinho dela.

— É menina?

— Foi o que me disseram na ultrassonografia. Espero que estejam certos, já me acostumei com a ideia.

— As meninas são adoráveis. Não que eu não goste dos meninos, eles também são ótimos, mas meninas são espe­ciais. Ora, todos são, claro. Você vai conhecê-los mais tarde. Aliás, os homens estão todos ocupados hoje. Quer vir comi­go buscar os garotos na escola? Depois podemos voltar aqui, e jantamos todos juntos.

Todos? Inclusive Emily?

Não, ela não estava preparada para isso, e nem para o en­contro de mamães na porta da escola.

— Preciso voltar para casa. Afinal, sou a empregada de Joseph e preciso trabalhar para ganhar meu dinheiro. Mas obrigada, mesmo assim.

— Foi um prazer. — Selena lhe entregou a sacola de roupas na porta, depois hesitou. — Sabe, Demi, Emily é uma pessoa adorável. Sei que ela disse coisas terríveis ontem, mas ela ama Joe e está preocupada com ele. Não sabemos o que Kate fez com ele, Joe não fala sobre isso, mas eles foram felizes em Nova York até ele voltar para casa, de repen­te. Sei que não é da minha conta, e. ele vai lhe contar, prova­velmente; mas Emily não quer vê-lo sofrer de novo.

— Mas, Selena, eu sou apenas a empregada — Demi frisou.

E Selena riu baixinho.

— É mesmo? Só sua empregada? Isso nós vamos ver.

— Sou apenas isso. Eu não quero me envolver com nin­guém, e não me parece que ele queira tampouco.

— Veremos. — Ela sorriu.

E, para surpresa de Demi, ela se aproximou e lhe deu um abraço.

— Cuide-se, Demi. Telefone-me se precisar de alguma coisa.

— Obrigada. Adorei passar essas horas com você.

— Eu também. Eu a levaria em casa, mas as meninas...

— Não tem problema. O dia está lindo, e a casa fica logo ali. Vou adorar caminhar.

Isso lhe daria tempo para colocar as ideias em ordem, principalmente sobre se envolver com Joseph Jonas...

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Capítulo novinho pra vcs. Comentem e deixem a tia Nath feliz :)

27.6.15

Lar da Paixão - Capitulo 4

Onde foi que ela se meteu?

Já estava quase escuro lá fora, a chuva batia no vidro da janela e Joe não entendia por que Demi ainda não tinha apa­recido. Não parecia tão cansada assim e devia ter acordado com o barulho dos trovões e da chuva.

Joe consultou o relógio mais uma vez. Já eram 8h30 da noite; será que ela ainda estava dormindo? Talvez estivesse esperando no quarto, lendo ou algo assim, achando que ele ia chamá-la. O que ele dissera? Não conseguia lembrar exata­mente. Será que não fora claro?

Joe foi até a porta do quarto dela e bateu.

— Demi?

Como não houve resposta, ele abriu a porta e sentiu um vento bater no rosto. Estranhou que uma das portas batesse quando ele entrou, e a outra estivesse escancarada, deixando a chuva entrar. Joe a chamou de novo, falou mais alto, mesmo assim não obteve resposta. Havia uma almofada no chão, do lado de fora, toda molhada da chuva.

Ele saiu para o terraço, pegou a almofada e olhou para o lado. Ali, bem do lado, estava o terraço onde ele e Emily estiveram conversando.

Falando sobre Demi.

Uma sensação de pavor tomou conta dele. Será que ela ouvira a conversa?

Talvez não. Ele voltou para dentro e fechou a porta de correr, chamou por ela mais uma vez, depois entrou no quar­to e parou.

O quarto estava totalmente vazio, exceto pela caixa de areia e pelas tigelas de comida da gata. As bolsas dela não estavam mais lá, a gata se fora, Demi se fora, e ele sabia mui­to bem o motivo.

Joe se encostou na parede e olhou para o teto. Demi ouvi­ra a conversa. Provavelmente estava do lado de fora, sentada na almofada e escutara tudo o que Emily dissera.

Devia ter entendido que ele era um dos construtores e pensado que a queria longe do hotel por causa da reforma; ela não entendeu os verdadeiros motivos dele e, em vez de confrontá-lo, decidiu fugir.

Que droga! Ela foi se esconder naquele anexo fedorento, como uma criminosa. E dificilmente sairia de lá agora.

Mas ele tinha de tentar. Não poderia deixá-la ficar sem uma explicação, nem que precisasse pagar um hotel para que Demi se hospedasse.

— Vou matá-la, Emily — ele falou baixinho.

Joe trancou a porta dos aposentos dela e correu pela casa, pegou a chave do carro, acionou o alarme e saiu. O carro dele estava do lado de fora, então ele manobrou rapidamente até o portão onde teve de esperar, com toda paciência, até que abrisse.

Como será que ela passara pelo portão? Ele nem teve tem­po de mostrar a Demi onde ficava o painel de controle, e ela também não sabia a senha. Será que ela ainda estava ali, no jardim, esperando que alguém abrisse os portões, ou será que saiu junto com Emily? Isso já tinha horas, quase cinco horas, e desde então não parou mais de chover.

Não, ela já tinha ido embora. Mesmo assim ele resolveu procurar por ela no jardim, só para ter certeza.

Nem sombra dela.

Ele deixou os portões abertos, para o caso de ela voltar, e dirigiu lentamente até o hotel, vasculhando as calçadas pelo caminho. Ela devia ter saído logo depois de Emily e àquela hora já estaria naquele buraco.

Ele praguejou baixinho, olhando para todos os lados atrás dela, e logo que virou a esquina ele freou bruscamente o carro.

Aporta estava bloqueada com tábuas de madeira! Nick devia ter interditado o lugar assim que soube que ela não estava mais lá. Ele disse que estava preocupado com a imagem deles. Devia ter chamado um operário da obra para fechar aquele lugar.

Agora não sabia mais onde procurar por ela.

Ele olhou em volta e sentiu medo por Demi. Devia estar morrendo de frio, pois ainda era junho. Congelada, zangada, sentindo-se traída e sozinha.

Sozinha, não. Tinha a gatinha. A velha gatinha que ela se negou a abandonar.

Droga!

Ele bateu no volante do carro e praguejou.

E agora? Danado da vida, ele teclou o número de Emily no celular.

— Demi desapareceu. Ela deve ter ouvido a nossa conversa. Saia para procurar por ela, e eu não quero desculpas. Isso foi por culpa sua. Você apareceu na minha casa gritando, fazendo acu­sações infundadas contra uma pessoa que nem conhecia, e se alguma coisa acontecer com ela, você será a única responsável!

— Ah, Joe! O tempo está péssimo! Onde você está agora?

— Estou em frente ao hotel. A porta do anexo foi bloque­ada. Ela não tem para onde ir, portanto, talvez tenha voltado para minha casa. Vá até lá e procure por ela no jardim. Eu olhei muito rapidamente. Deixei o portão aberto, mas a casa está trancada, então ela pode estar abrigada em algum lugar no jardim, na parte de trás, nos arbustos ou algo assim.

— Não, ela não vai estar ao relento, Joe, não nesta tem­pestade! O tempo está péssimo!

— Sei disso, e com certeza ela também sabe, depois de quase cinco horas. Só estou com esperanças de que ela tenha voltado para a minha casa.

— É mesmo? Acha isso provável?

— Talvez não, depois de tudo o que ela ouviu, mas ela não tem muitas opções, eu acho. Faça isto, por favor, Em, ou mande Harry ir lá. E se não a encontrar, peguem o carro para procurá-la, e eu vou fazer o mesmo. E ligue para mim!

— Espere, não desligue! Eu nem sei como essa moça é! 

Linda.

Ele pigarreou antes de falar:

— Sabe sim. Uma mulher grávida carregando uma mo­chila e um gato. Duvido que encontre muitas por aí. Se algu­ma coisa de ruim acontecer a ela, eu mato você!

Ele desligou e ligou para Nick:

— Pegue o carro e saia para procurar por Demi. Ela desa­pareceu — ele disse, depois deu a mesma descrição que dera para Emily.

— Entendi — o amigo disse e desligou.

*****

Demi estava morrendo de frio.

Toda molhada, ela batia os dentes, e a gatinha tremia no seu colo. A gata podia ser surda, mas ela sentia o trovão; a coitadinha estava apavorada.

As duas estavam encolhidas na porta de uma loja, a mes­ma em que Joseph a escondeu; teria sido na véspera? Foi do outro lado do hotel onde ela estava vivendo, abrigado da chuva, mas em uma rua mais movimentada onde as pessoas que passavam olhavam para ela.

Ninguém parava, preocupados em chegar em casa para se proteger dá borrasca, pelo que Demi dava graças a Deus, porque ela não queria ter de sair dali, nem ter de se explicar. Ao menos ela e a gata estavam abrigadas ali, e sentada na mo­chila ela estava quase confortável.

Sua preocupação agora era saber para onde ir, e com a gata suas opções eram ainda mais limitadas.

O que ela estava pensando? Suas opções eram poucas de qualquer forma, sem dinheiro, sem amigos e com alguns ini­migos de peso.

Sem falar de Emily, que por algum motivo parecia odiá-la, mesmo sem conhecê-la. Seria por causa do marido, Harry e por alguém chamado Carmen... ela não pegou tudo. E quem seria Kate? Não que isso importasse. Nada importava, a não ser encontrar um lugar seco onde pudesse se deitar.

Ela olhou para cima, se perguntando se não haveria onde se sentar na estação em frente e ficar mais aquecida, e bem diante dela apareceu o carro de Joseph, percorrendo lenta­mente a rua.

Ah, meu Deus, ele estava procurando por ela! Não podia ser. Estava tão zangada que poderia perder a calma e dizer uma besteira. Ela se encolheu tentando não ser vista, mas não tinha jeito. Ele parou o carro junto ao meio-fio, deixando o motor ligado, e a abriu a porta no meio da rua.

Alguns carros buzinaram, mas ele os ignorou, correndo para ela, agachando-se na porta de modo que ele não podia ver seu rosto. No entanto, ela podia ouvi-lo, ouvir o tremor na sua voz quando ele agarrou seu braço e a sacudiu levemente.

— Onde você esteve?! Eu estava louco atrás de você!

— Deixe-me!

— Eu sinto muito, Demi, por favor venha até o carro para conversar comigo. Deixe-me explicar.

— Não. Eu não vou com você.

— Eu lhe darei a chave do carro. Assim, não poderei diri­gir e levá-la para algum lugar aonde não queira ir. Mas, por favor, deixe-me explicar. — Ele passou a mão pelo cabelo, e a água escorreu pelos fios.

Ela olhou para Joseph com mais atenção e viu que estava encharcado. Molhado e com frio, quase tanto quanto ela. Ele tinha saído à sua procura, não apenas dentro do carro, mas procurando por ela na chuva.

Mas por quê?

— Explicar o quê? — ela perguntou. — O motivo de ter mentido para mim?

— Eu não menti. Só não lhe contei toda a verdade.

— Só não me contou a maior parte. Ou a parte mais im­portante.

— Eu lhe contei a parte que importava. 

De repente um carro buzinou e freou.

— Você deixou a porta do carro aberta — ela lhe lembrou sem necessidade, mas ele não deu importância.

— Por favor, venha comigo. Vamos para algum lugar onde possa se aquecer, tomar uma bebida quente e conversar sobre isso. Vamos a algum lugar público, a um café ou algo assim. Você escolhe onde.

— Estou com a gata — ela comentou.

— Demi, por favor — ele disse outra vez.

E, porque ele estava começando a tremer e ficando cada vez mais molhado, se isso era possível, ela cedeu.

— Está bem, mas só no carro. Não vamos a lugar nenhum. E você tem cinco minutos.

*****
 
Joseph teve de tirar o carro dali, pois estava obstruindo a passagem, mas foi só até virar a esquina, entrar no estaciona­mento do hotel e parar junto à caçamba de lixo onde estava o antigo colchão dela. Então ele desligou o motor, entre­gou-lhe a chave e se virou para ficar de frente para ela.

— Não sei por onde começar a pedir desculpas — ele disse.

— Esqueça o pedido de desculpas. Eu quero a verdade, toda ela. E pode ligar o aquecimento?

— Não sem a chave do carro.

Sem dizer nada ela lhe entregou de volta a chave e ele li­gou o motor e o aquecimento. Eles estavam tão molhados que, mesmo com a temperatura controlada ali dentro, as ja­nelas ficaram embaçadas e o carro ficou com um cheiro de cachorro molhado. A gatinha tremia.

Pobre Pebbles.

Demi fazia carinho na gata; seus dedos estavam quase azuis de tanto frio, e ela precisava tirar aquelas roupas molhadas.

— Isto é loucura. Deixe-me levá-la para casa para que possa se enxugar e se alimentar. Você deve estar morrendo de fome, e está com frio, e a gata está congelado.

Ela olhou para Pebbles e algo pingou sobre ela. Poderia ter sido água do cabelo dela ou uma lágrima, e seu coração ficou apertado.

Joe segurou seu rosto, virando-a para ele, e viu outra lá­grima escorrer pelo semblante zangado.

Ele limpou a lágrima no rosto de Demi com o polegar e, em seguida, fitou seus olhos azuis como o céu. E decepciona­dos. Com ele. O que o deixava triste.

— Deixe-me levá-la para casa, por favor. Não precisa fi­car. Deixarei o portão aberto, poderá sair quando quiser. Não vou machucá-la, Demi.

— Não. Vai mentir para mim, você, sua irmã e seus amigos. Pensei que estivesse brigando com Ian, mas você era o verdadeiro inimigo o tempo todo. Agora você venceu, conseguiu me tirar de lá, parabéns. Como se sente roubando meu bebê? — Ela afastou a mão dele abruptamente e enxugou as lágrimas que insistiam em cair.

— Nós não...

— Ah, foi! A minha filha tinha uma herança, e agora, Joseph, vai ser muito mais difícil. Eu sabia que era bom demais para ser verdade. Eu cheguei a lhe dizer isso, mesmo assim me deixei enganar. Não acredito que tenha sido tão burra! Mas você não devia ter bloqueado a porta. Eu poderia ter voltado para lá. Ainda posso dar um jeito...

— Não. — Ele balançou a cabeça. — É perigoso demais. E, como se para ilustrar o que ele dizia, uma folha do te­lhado voou e caiu diante deles, bem no estacionamento.

O lábio dela tremeu, e Demi virou a cabeça para o outro lado. Em seguida, o telefone tocou. Joe atendeu e colocou no viva-voz para ela ouvir o que Emily tinha a dizer:

— Alguma noticia?

— Eu a encontrei — ele falou para a irmã.

— Graças a Deus! Ela está bem?

— Graças a você, não.

— Ah, Joe, desculpe-me. Eu só pensava na experiência com Carmen, estava tão preocupada que você se machucasse, sei como vocês, homens, podem ser protetores. E me perdoe por ter comentado sobre o seu caso com Kate. Escu­te, posso falar com ela, tentar explicar...

— Acho que já falou demais por hoje — ele disse. — Não se preocupe, estou cuidando dela.

Depois de uma pequena pausa, Emily acrescentou:

— Está bem. Então, diga-lhe que eu sinto muito, está bem? E eu telefono para você amanhã.

— Faça isso. — Ele desligou e virou-se para ela. — Pre­ciso ligar para Nick. Ele também está procurando por você.

— Preocupado em ser processado?

Ele passou a mão pelos cabelos molhados e soltou um suspiro.

— Não. Está preocupado com uma mulher fragilizada, na rua em dia de tempestade, sem ter para onde ir por causa dele. — Depois ele falou com carinho: — Não estávamos caçando você, Demi. Estamos do seu lado.

— Bem, desculpe-me se não acredito em você — ela dis­se, tensa, e a raiva de Emily veio à tona novamente. — Que ousadia a dela, Joseph! Como pôde fazer aquelas acusações contra mim? Ela nunca sequer me viu! Não me importo se é sua irmã, isso é imperdoável. Eu jamais faria um julgamen­to desses sobre alguém que não conhecesse. Quem ela pen­sa que é?!

Ela percebeu o nível de irritação e resolveu se calar. Vi­rou-se para a janela. Demi se perguntou se Joseph seria um homem genuinamente bom ou apenas um tolo ingênuo como sua irmã dissera. Ou coisa pior. Como ele mesmo disse, Georgie não sabia nada sobre sua vida privada. Ele poderia muito bem ser um assassino serial.

Demi estava quase deixando o carro para sair na chuva quando viram um relâmpago seguido de um trovão, bem perto do carro, e a gatinha tremeu e miou. Não. Não poderia fazer isso. Pebbles morreria, e ela não aguentaria viver com essa culpa.

Joseph estava falando com Nick ao telefone, contando que Demi estava em segurança e que falaria com ele no dia seguinte. Ela recebeu um pedido de desculpas de Nick, tam­bém, antes que Joseph desligasse o celular; e talvez fosse aquilo ou apenas pelo fato de Pebbles estar chorando agora, então ela resolveu ceder.

— Está bem — ela disse friamente. — Mas só por causa da gata. Vou deixar que me leve de volta para poder secá-la e alimentá-la, depois vou me trocar e querer saber exata­mente o que esta acontecendo. Só então vou decidir o que faço.

— Está bem — ele disse, aliviado.

*****

— Por onde quer que eu comece?

Ela olhou desconfiada, sem saber se poderia acreditar em qualquer coisa que viesse daqueles lábios lindos e mentiro­sos, mas ele havia deixado o portão aberto, mostrou onde ficava o painel de controle e revelou o segredo, caso Demi encontrasse o portão fechado.

Também lhe deu a chave da porta da frente e da porta la­teral, o código do alarme, e algum dinheiro, cerca de duzentas libras esterlinas, tudo o que tinha no bolso, segundo ele. E mais um cartão de débito e a senha.

Sério? Era tão confiável assim? Ela não seria tanto. Tal­vez a irmã estivesse certa sobre ele. Ou talvez fosse por­que mesmo que ela saísse gastando loucamente com seu cartão, não seria um prejuízo tão grande quanto faria no seu empreendimento hoteleiro, atrasando a reforma. En­tão, ele queria diminuir os prejuízos ou estava sendo mes­mo decente?

Ele a instalou no quarto de hóspedes, e quando ela saiu do chuveiro Joe já havia envolvido a gata numa toalha quente e a alimentado. E também tirara as roupas dela das sacolas.

— Suas roupas estão todas molhadas — ele disse.

Joe saiu e voltou logo depois com uma calça de moletom, uma camiseta e um grande roupão atoalhado e fofo que ela logo vestiu. Tudo era grande demais, mas Demi não se impor­tava; estava aquecida, a gatinha dormia em seu colo e suas roupas estavam sendo lavadas na máquina, enquanto espera­va que ele começasse a falar.

Joe usava um jeans desbotado e uma blusa de malha, e Demi deduziu que ele tivesse tomado um banho enquanto ela se vestia. Os pés estavam aquecidos com grossas meias es­portivas que ele apoiou sobre a mesa de centro.

— Comece desde o início, Joseph. Desde quando você se deu conta de que eu estava morando lá e resolveu executar seu plano.

— Não foi um plano.

— Chamaria de que, então? Ah, sim, eu me lembro, "re­solver um problema" — ela disse. — Acho que foram essas as suas palavras.

Ele praguejou baixinho e passou as mãos pelo cabelo, sa­cudindo os fios molhados e depois tirando o cabelo da testa para que ela pudesse ver melhor seus olhos.

— Já tinham se passado cerca de 15 dias desde que fina­lizamos...

— Finalizaram?

— Sim, o que você pensou? Que estávamos apenas jogan­do dinheiro fora e tornando sua vida insuportável? É claro que terminamos. Terminamos um dia antes de Brian morrer. Tínhamos feito um acordo, segundo o qual ele poderia ficar por lá por até um mês após a conclusão para lhe dar tempo de pagar as dívidas e encontrar um lugar para morar. Mas, para ser sincero, acho que ele percebeu que estava morrendo e queria receber o dinheiro antes, então a venda não foi con­cluída, por isso nos deixou correr com a obra.

— Então, Brian morreu antes que pudesse fazer qual­quer coisa com o dinheiro. — Demi afundou no sofá, en­quanto pensava. — Mas se você pagou, onde está o dinhei­ro? Com Ian?

— Acho que não. O escritório não vai liberar até que o testamento seja validado. Havia uma pequena quantia reti­da que seria paga quando a propriedade fosse entregue to­talmente desocupada. Esse valor ainda não foi pago por­que, claro, o imóvel não foi inteiramente desocupado até hoje.

— Até que você bolou um plano para me tirar de lá.

— Eu não bolei plano nenhum, isso é mentira; eu fiz, sim, mas não por aquela razão.

— E por que foi?

— Porque era perigoso demais! Eu não dormi na noite passada preocupado com você naquele lugar, com o teto caindo, e quando voltei esta manhã, a parte sobre a escada havia caído também. O telhado está em péssimo estado, Demi. Você viu uma parte dele voar durante a tempestade. Assim como a cobertura está podre, as vigas devem estar também. É uma questão de tempo, tudo vai desabar. E você precisa pensar na criança que está esperando.

Instintivamente, Demi abarcou a barriga pensando na filha. Ele tinha razão, era muito perigoso. Na noite passada, quan­do o teto caiu, ela se assustou, e estava no banheiro quando aconteceu uma semana antes. Todas as suas roupas foram destruídas, o colchão ficou encharcado e coberto de gesso, tudo ficou estragado.

Se ela estivesse na cama...

Demi tremeu só de pensar.

— Você está bem? Está aquecida?

— Sim.

Após uma longa pausa, ele falou de novo:

— Demi, eu quis tirá-la de lá com a melhor das intenções, e se nos convém que você saia de lá, isso é apenas um bônus. Se fosse seguro lá, eu teria deixado você ficar, se era isso que queria, e depois a levaria para conversar com nossos advoga­dos para resolver sua reivindicação.

— Pois assim poderá resolver o problema e se livrar de mim o mais rápido possível?

— Porque eu não quero que seja enganada por um homem que nunca veio visitar o pai, só quando soube que ele estava morrendo.

Será que podia acreditar nele? Ele parecia bem revoltado.

Ela não tinha muita escolha, pensou. Não tinha onde mo­rar, não tinha dinheiro e estava prestes a se tornar mãe. Não possuía um leque de opções, digamos assim, e estava cansa­da de lutar.

— Sabe, se eu soubesse que vocês tinham terminado e que eu não poderia reverter a situação, não teria passado tan­to tempo naquele lugar horroroso. Achei que estava tudo suspenso por causa do testamento. Então, por que não me despejaram de lá, simplesmente?

E, para sua surpresa, ele riu.

— Era o que estávamos tentando fazer. Foi por isso que marcamos de visitar nossos advogados amanhã. Ainda está­vamos com dificuldade de tirar você de lá, e atrasando a obra. A reunião de amanhã era para discutir esse assunto.

— Então por que me ofereceu um emprego? Se a sua equipe ia resolver o problema, por que não deixou por conta deles?

— Porque descobrimos que você estava grávida — ele disse, sem jeito.

— E daí?

— Isso faz uma enorme diferença. Minha irmã passou por uma experiência semelhante quando estava grávida, e ela voltou a viver na casa dos meus pais. Ela era um pouco mais velha do que você, com uma filhinha e um bebê a caminho, mas ao menos tinha uma família a quem recorrer. Você não tem nada, e por pior que me julgue, eu não poderia deixá-la na rua. E também acho que não aceitaria caridade, e você sabe que preciso de alguém para cuidar da casa. E tenho bas­tante espaço aqui.

Os argumentos dele eram definitivos, mas havia algo na sua maneira de não olhar para ela que a deixava intrigada. Parecia estar escondendo alguma coisa dela. Algo a ver com Kate? Não importa, mais tarde ela voltaria a tocar nes­se assunto.

— Então, como foi exatamente que soube de mim?

— Soubemos que havia um inquilino, uma ex-funcionária do hotel, que estava com uma reivindicação maluca quanto à propriedade; nas palavras deles, não minhas. Disseram que não seria problema, que você sairia dentro de um mês. Só que depois de um mês, você continuava lá.

— E Ian lhe disse que eu não tinha nenhum direito?

— Exatamente. Ou advogados dele disseram, mas não sei como, já que o testamento não apareceu.

— Mesmo sem o testamento, há uma chance para minha filha. Existe uma lei antiga que se refere aos bebês. Cha­ma-se en ventre sa mère.

Ele balançou a cabeça e ela ficou surpresa. Então ele já tinha se informado sobre isso?

— Mas tenho de provar que ela é filha de Jamie, antes de mais nada...

— Tem alguma dúvida?

O olhar de indignação dela o fez se desculpar.

— Só estava perguntando, Demi. Poderia ser relevante. Se vamos brigar do seu lado, precisamos saber se existe outra possibilidade.

— Na sua família, ninguém é digno de confiança? — ela perguntou, e ele ficou calado. Na verdade, ela também achou que tinha sido dura demais, então abrandou o tom: — O bebê é de Jamie, sim. Não sou eu quem precisa de uma prova, Joe — ela falou com delicadeza. — São os tribunais. E se Ian se apossar do dinheiro antes do nascimento dela...

— Mas ele não vai conseguir. Se você fizer sua reivindica­ção, o dinheiro não será liberado enquanto o inventário não for concedido. Nossos advogados vão conversar com você sobre isso amanhã. Imagino que concorde em encontrá-los.

Mais uma vez Demi se via sem opções. Poderia se arriscar a ficar na rua. Ou ela poderia ficar nessa casa linda com um homem que, apesar do seu receio, não tinha motivos para confiar nela, mas que estava sendo gentil e queria ajudá-la nessa batalha legal por segurança.

E essa era a palavra mágica.

Segurança.

Para ela, para a gata e acima de tudo para a sua filha.

— Demi?

Ela o encarou e tentou sorrir.

— Sinto muito. Acho que o julguei mal. Ao menos lhe devo o benefício da dúvida.

— Tendo em vista o que você ouviu, seria mais do que razoável você me julgar mal. Então, você me perdoa? Ou melhor, nos perdoa? Vai ficar?

— Você falou sobre assinar um contrato de trabalho. Acho que parece ser uma boa ideia. Não quero ter de ouvir insinuações.

— Claro, podemos fazer isso amanhã.

— E você mencionou jantar.

— Foi sim. Frango à caçarola, que já está pronto na cozinha. 

Ela sorriu, cautelosa.

— Então começaremos pelo frango e vamos nos preocu­par com o resto amanhã.

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Hey girls, finalmente voltei. E ai como estão? Depois de muito tempo aqui estou eu. 
Comentem bastante que eu posto 2 capítulos hoje.