27.12.14

Capitulo 7 - MARATONA 2/10


JOE

Eu nunca tinha ido a um lugar tão feio quanto aquele.

Era a primeira vez que me atrevia na Baixada Fluminense e parecia outro mundo, com casas pequenas e humildes, gente comum e maltratada, ruas com calçadas desiguais e muitas crianças na rua.

Enquanto tocava a campainha da casa de Juliane, uma horrível construção antiga, pequena, com pintura rosa descascada, eu olhava para a rua sem saída com desconfiança. Preocupava-me com meu Porsche preto ali em frente.

Os vizinhos, sentados em seus portões naquele início de noite, olhavam para o carro e para mim abismados, como se eu fosse um ser de outro planeta que desci do céu com meu Porsche ali. E era assim que eu me sentia.

Em uma casa ali ao lado, alguém tinha escrito com letras tortas: “ Atenção, motoristas:

Crianças e bêbados na rua”.

Balancei a cabeça, indagando a mim mesmo o que estava fazendo ali. Que loucura tinha sido aquela de inventar uma visita só para estar com a irmã de Juliane? Devia estar realmente louco.

Sim, ela tinha me impressionado. Quando isso acontecia, eu gostava de resolver logo o problema. Mas ir até ali tinha sido um impulso sem cabimento. Nem uma mulher lindíssima como Demi valia aquele transtorno.

Quando uma senhora baixa e gordinha abriu o portão para mim, percebi que era tarde para lamentações e a encarei.

Ela parecia um leitãozinho, com bochechas coradas e redondas, olhos pequenos e espertos. O cabelo tingido de preto se tornava discrepante com as rugas em seu rosto. Seu vestido estampado parecia feito de cortina, em um tecido ordinário, e a engordava ainda mais.

Sorrindo alegremente, estendeu-me a mão roliça e branca, olhando-me de cima em baixo com admiração.

- Joe Adam? Que prazer conhecer você! Sou Tereza, mão de Juliane.

- Ah, sim. Como vai a senhora? – Apertei sua mão, um pouco seco.

- Bem, agora que você está aqui. Fico feliz que seja tão bom e se preocupe com a minha filha.

Eu larguei sua mão, um sorriso lento se estendendo em meus lábios. Sim, eu estava ali pela filha dela. Demi.

- Não quer entrar? – Seus olhos se arregalaram para meu Porsche. – Ah, o seu ... carro estará em segurança. Não se preocupe.

- Não estou preocupado. – Menti.

Eu a segui pelo caminho calçado até a varanda pequena e antiga, com infiltração esverdeada em uma das paredes. As janelas e portas eram medíocres e o chão de vermelhão. Olhei rapidamente em volta, escondendo meu desagrado com um lugar tão feio e malcuidado.

- Por favor, não repare em nada. Somos muito pobres. Mas sinta-se à vontade. A casa é sua. – Ela sorriu e abriu a porta.

“Minha não, graças a Deus!”, sorri educado.

A sala era horrível. Paredes grosseiras e brancas, uma estante barata com televisão antiga, som e DVD, tudo de má qualidade e ultrapassado. Senti nojo ao fitar o sofá de dois e três lugares, cobertos por uma capa vagabunda azul com estrelas estampadas em amarelo.

Para combinar com o horror de tudo aquilo, sentada no sofá estava Juliane, mais parecendo um pugilista derrotado por nocaute após uns cinco assaltos. Seu olho esquerdo e sua boca estavam inchados e roxos. Hematomas se espalhavam por todo lugar. E ela mantinha a boca fechada, para esconder a falta do dente.

Eu quase dei meia volta e parti.

- Sente-se, Joe, fique à vontade. Olha, querida, ele veio mesmo. Que delicadeza, não? Sem alternativa, me aproximei de Juliane e beijei o alto da sua cabeça. Falei baixo:

- Você está melhor do que eu pensava.

- Jura? – Ela murmurou, mal abrindo os lábios. Seu olho bom marejou. Pôs a mão sobre a boca. – Eu me sinto horrível.

- Sente, Joe. Somos pobres, mas tudo é limpo. – Sorriu Tereza, sentando-se ao lado da filha.

Eu me sentei no outro sofá. Era duro e cheguei mais para o canto, fugindo de uma mola solta. Sorri forçado para as duas. Onde estaria a razão da minha presença ali? Só faltava Demi ter saído.

- Como você está se sentindo? – Eu me forcei a olhar para Juliane.

- Mal. Só você mesmo para vir aqui e levantar o meu ânimo. – Já ia sorrir, mas lembrou da falta do dente e pôs novamente a mão sobre a boca.

- Estamos muito felizes! – Emendou Tereza sorrindo bobamente, seus olhos percorrendo com admiração meus sapatos italianos, a calça jeans sob medida e a camisa rosa clara de uma grife famosa.

Eu me indaguei como Juliane e principalmente Demi haviam saído de um ser tão sem graça quanto Tereza. Além de gorda e feia, parecia uma idiota.

Ouvi barulho vindo do corredor da sala e meus instintos despertaram na hora, alertas. Naquele momento Demi entrou na sala.

Ao olhá-la, todo meu arrependimento por estar ali sumiu como fumaça. Corada, cheirando a sabonete e com os cabelos muito loiros caindo molhados e longos pelas costas, ela era extraordinariamente linda. Seu rosto sem maquiagem era perfeito e seus olhos de um tom lindo de prata polida brilhavam, grandes, como dois pedaços de espelhos. Os lábios carnudos e rosados estavam ligeiramente entreabertos.

Totalmente simples de jeans e blusa larga, Demi era mais bonita que a maioria das mulheres. Imaginei como ficaria usando salto, maquiagem e vestido longo. E senti o desejo me varrer por dentro, denso e quente, quando imaginei como ficaria nua.

Aproximou-se de mim com olhar direto e eu me levantei, fazendo o possível para manter uma expressão neutra.

- Oi. É um prazer recebê-lo aqui. Seja bem-vindo. – Ela estendeu-me a mão. Apesar de sorrir, havia um certo nervosismo e constrangimento em seu olhar.

- Tudo bem, Demi? – Apertei sua mão, gostando muito de sentir seu toque, os dedos longos e finos, a palma macia contra a minha. Era pequena, delicada.

Senti um leve tremor percorrê-la e seus olhos se arregalaram um pouco. Retirou a mão e fiquei satisfeito ao ver que, apesar de disfarçar, eu mexia com ela. Não era indiferente a mim.

Mas aliás, que mulher era?

- Sim. Por favor, fique à vontade. Eu queria me desculpar novamente por ...

- Esqueça. – Ignorei aquilo.

- Mas eu ...

- Entendi tudo que aconteceu. Não se preocupe mais com isso. – Sorri devagar, meus olhos sem desviar um milímetro sequer do dela.

- Certo. – Seu sorriso era um pouco ansioso. – Aceita um café?

- Claro. Obrigado. – Tornei a me sentar.

- Temos biscoitinhos amanteigados. – Informou Tereza. – Nada chique, mas o pão da padaria também é bom. O que mais você fez, Demi?

- Não, obrigado. Aceito apenas o café puro.

Demi concordou e saiu da sala. Eu não sentia nenhum interesse nas outras duas mulheres mas me voltei para elas e indaguei a Juliane, polido:

- Como isso aconteceu?

Ela estremeceu ligeiramente e por um momento seu rosto espelhou pavor.

- Conheci um homem e saí com ele. Era um sádico. Um louco.

- Juliane não costuma ser assim. – Explicou Tereza. – Mas ela estava triste porque vocês brigaram e, tola, quis afogar as mágoas com outro. Uma lástima! Infelizmente conheceu o homem errado.

- Precisa tomar cuidado, Juliane. Há muitos loucos por aí.

Demi entrava na sala naquele momento e ouviu o que eu disse. Pareceu concordar comigo.

- O café. – Ela se aproximou com uma pequena bandeja e um xícara no pires. Havia ao lado colher e açucareiro de inox.

- Obrigado.

Peguei a xícara branca e Demi deixou a bandeja sobre a mesinha de centro. Sentou-se no braço do sofá ao lado de Juliane, quase de frente para mim.

- Eu vivo dizendo para ela tomar cuidado. – Disse Tereza, como uma mãe muito zelosa. – Mas sabe como são os jovens hoje!

Fingi estar atento ao que ela dizia, quando toda minha atenção se concentrava em Demi. Ela me perturbava, despertava cada célula masculina do meu corpo e um sentimento de posse, de estar logo com ela sob meu domínio. Minha mente trabalhava com aquele objetivo.

- É a primeira vez que conheço um namorado de Juliane. – Tereza não parava de falar.

- Eu e Juliane somos apenas amigos. – Esclareci, bem sério.

Juliane fez cara feia. Tereza ficou um momento muda. Demi mudou de assunto:

- Juliane disse que o senhor ...

- Você. – Eu a interrompi, fitando-a de maneira penetrante.

- Claro. Você é empresário no ramo editorial. Deve ser interessante.

- Muito. O conglomerado engloba jornais, revistas e livros. – Analisei-a detidamente. – Você é modelo?

- Não, sou secretária em uma firma de advocacia.

Eu imaginei como o patrão dela devia ser felizardo, tendo-a à disposição. As tardes dele no escritório deviam ser muito interessantes, se Demi fosse parecida com a irmã. Mas algo nela parecia bem diferente, séria, centrada. Podia ser só uma impressão.

- Faço faculdade de História à noite. Vou ser professora assim que me formar.

Ergui de leve uma sobrancelha.

Professora de História, com aquela aparência? Todos os alunos seriam apaixonados por ela.

- Eu não sei por que Demi faz essa faculdade. – Tereza franziu o cenho. – Ela ganha mais como secretária do que ganhará como professora.

- Faço História por que eu gosto. Mesmo sabendo que professores não são valorizados no Brasil.

- Vai entender ... – Juliane disse com ironia. – Minha irmã é uma dessas pessoas superiores, que não ligam para dinheiro e aparência física.

- Eu não sou superior. – Demi parecia conter a custo a irritação e me lançou um olhar sério. – Desculpe. Nós geralmente discordamos sobre diversos assuntos.

Eu não disse nada, percebendo a clara tensão no ambiente. Obviamente Demi não pensava como as outras duas. Parecia responsável demais para sua idade. OU queria dar uma de boazinha para me impressionar ou não era tão fácil como a irmã. Nesse caso, seria mais difícil chegar até ela. Não soube se aquilo me incomodava ou me incentivava mais.

Juliane puxou assunto sobre banalidades e prestei atenção educado, mas entediado. Minha mente trabalhava, tentando formar uma impressão de Demi, ao mesmo tempo que meu corpo reagia com desejo à presença dela. Comecei a me impacientar. Não costumava gastar muitas energias em uma conquista.

Para piorar a situação, Tereza sempre dava um jeito de falar em dinheiro. Desculpou-se de novo pela casa feia, pela xícara simples, pela televisão pequena, comentando que não possuíam nada melhor por falta de verba. Também jogou indiretas de que o sonho de Juliane era sair em revistas e aparecer em comerciais. Só faltou pedir claramente que a filha saísse em uma das capas das minhas revistas.

Percebi o modo como Demi olhava irritada para a mãe, cortando-a e mudando de assunto a todo momento. Eu pensava em um jeito de sair dali e ficar a sós com Demi, pois

nem toda beleza dela estava sendo o bastante para aturar aquela tortura com Tereza e Juliane.

A garota só lhe servira na cama algumas vezes e não o agradava mais em nada. Ainda mais com a aparência atual.

- Mas é claro que ela não poderá trabalhar por algum tempo, não é, querida? – Tereza continuava a falar e a filha concordava. – Mas tão logo fique boa, Juliane fará uns testes para comerciais. Sabe como o meio é concorrido, mas às vezes, com um empurrãozinho de alguém do ramo, tudo se torna mais fácil ...

- O senhor ... você aceita mais café? – Demi tentou interromper a mãe.

- Não, obrigado. Preciso ir embora. – Eu já me preparava para fugir dali, em meu limite.

- Ah, não vá tão cedo! – Tereza sorriu docemente. – Que tal ver televisão? Nesse horário passam vídeos tão engraçados! SE bem que a imagem dessa tevê está uma porcaria! Já falei com a Demi que precisamos de uma televisão nova. É o meu sonho uma daquelas grandonas, sabe, de 51 polegadas! Na sua casa deve ter uma dessas, não é?

- Tem cada uma! Bem maior! – Emendou Juliane.

- Deus do céu! – Tereza riu. – Eu nunca mais sairia da frente da tevê!

- Mãe ... – Demi disse entredentes.

Eu me levantei.

- Realmente preciso ir. Foi um prazer conhecer a senhora. E quanto a você, Juliane, se precisar de alguma coisa, sabe meu telefone. – Inclinei-me e beijei sua testa. - Fique, Joe! Por favor! – Ela pediu, esperançosa.

- Não dá.

- Mas você volta, não é?

- Sim. Eu ligarei para você.

Virei para Demi, que tinha se levantado. Ela disse:

- Acompanho você até o portão.

Eu concordei. Finalmente teria o que planejei ao vir até aquela pulgueiro. Me despedi das outras e saí, seguindo Demi. Passei o olhar pelos cabelos dela, de um loiro muito claro e reluzente, sedosos até o meio das costas. Imaginei-os espalhados na cama enquanto eu a fodia com força. Senti o desejo subir, lento e denso, forte.

Meu olhar seguiu sua cintura fina, os quadrilha arredondados, abunda empinada dentro do jeans. Tinha pernas longas, que ficariam perfeitas em volta de mim.

Chegamos ao portão e fiquei aliviado ao ver meu Porsche preto ainda ali, inteiro. Demi parou e se voltou para mim. Sob a luz de um poste ali perto, seus olhos pareciam pratas derretidas. Mordeu o lábio, visivelmente incomodada.

- Eu queria pedir desculpas.

- De novo? – Sorri de leve, parando a poucos passos dela, baixando meus olhos até os seus. O topo de sua cabeça chegava na altura do meu queixo.

- Agora é pelo que aconteceu lá dentro. Minha mãe parece que vive em outro mundo.

Esqueça tudo o que ela disse.

- Não foi nada demais. – Minha vontade era de encostá-la naquele portão feio e beijar sua boca. Senti o pau se avolumar dentro da calça, a excitação me percorrendo devagar.

- Você é muito bem educado, sen ... Joe.

Era a primeira vez que me chamou pelo nome. Continuei a fitá-la de maneira penetrante, minha mente cheia de imagens pornográficas.

- De qualquer forma, obrigada por sua gentileza, por se preocupar com Juliane e por ter vindo vê-la. Ela ficou muito mais animada.

- Vim como amigo. – Eu esclareci, bem atento a ela, com voz baixa. – Espero que ela não tenha confundido com algo mais profundo.

- Não sei. Acho que ficou esperançosa. – Mexeu-se um pouco, parecendo um pouco nervosa sob o meu olhar direto.

- Não era essa a minha intenção. Demi, você aceitaria jantar comigo? Ela arregalou os olhos, surpresa.

- O quê?

Eu repeti, sem vacilar:

- Aceita jantar comigo?

- Bem, eu ... Você e Juliane ... – Ficou corada.

- Somos amigos.

- Mas foram namorados.

- Não. Apenas nos encontramos algumas vezes.

Demi desviou o olhar para a rua, para meu carro e de volta para mim. Seus olhos pareciam ainda maiores, brilhantes.

- Desculpe, mas não posso aceitar. Não me envolvo com homens que já namoraram a minha irmã. Ainda mais quando, obviamente, ela ainda tem esperanças de conquistar você.

Apesar de suas palavras, seu olhar não me enganou. Era o de uma mulher tentando disfarçar a atração que sentia, querendo a todo custo lutar contra. Indaguei baixo: - Quer dizer que a sua resposta é não?

- Desculpe.

- De novo?

Demi acabou sorrindo, muito corada.

- É uma pena, Demi. Gostaria de conhecer você um pouco melhor. – Falei sedutoramente, meus olhos penetrantes praticamente obrigando-a a me olhar, percebendo sua respiração mais agitada.

Parecia lamentar não poder dizer sim. Era expressiva, mesmo quando queria esconder o que sentia. E eu já tinha tido mulheres demais, sabia reconhecer quando uma me desejava.

- Foi bom conhecer você, Joe.

Frustrado, senti a irritação me consumir. Tive vontade de insistir, mas algo me travou.

Talvez notar que ela tinha realmente alguns valores. Que aquela não seria a melhor tática.

De qualquer modo, não estava acostumado a receber não. Não soube bem como lidar com aquilo. Teria que pensar em algo. Pois agora, mais do que nunca, eu estava decidido a tê-la.

- Foi bom conhecer você, Demi. – Falei baixo, charmoso, sem demonstrar como realmente me sentia. – Espero poder ver você novamente.

- É, talvez. – Seu sorriso era nervoso.

- Até breve.

- Até.

Acenei com a cabeça e saí, sabendo que me observava enquanto entrava em meu

Porsche. Não olhei para trás. Ela ainda ouviria muito falar de mim.

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