14.9.15

Escolha - Capitulo 1


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Demi Kingston

Redatora-assistente de publicidade na BBDA

Manhattan

Estudou Publicidade e Moda na Case Western University

Mora em: Manhattan

♥ Solteira

De: Ohio

Nascida em 20 de Agosto

DEMI KINGSTON morava em Manhattan há cinco meses e 12 dias. Essa era sua terceira visita à cozinha do porão da Igreja de St. Mark, onde ela e 16 mulheres, que mal conhecia, estavam trocando o equivalente a dez dias de pratos congelados. Ela havia sido convidada por Lucy Prince, que Demi conhecia havia quatro dias. Lucy não fazia parte da troca. Não mais. Ela havia se mudado para Buffalo com seu noivo, liberando assim o futon no qual Demi dormia no apartamento de um quarto que dividia com mais três garotas. O aluguel de Demi era um roubo, 700 pratas por mês. Já nem se lembravam de quando o fogão funcinou pela última vez.

Tecnicamente, esta era sua sexta visita à cozinha. Demi havia conseguido permissão para ir ao porão da igreja comunitária nas noites anteriores às trocas para preparar seus pratos congelados. Nessa semana, havia 16 porções de lasanha vegetariana e chilli não muito picante, tudo acondicionado em pequenos recipientes que iam do freezer ao micro-ondas, prontos para serem entregues durante a troca quinzenal.

Embora tenha soado estranho quando Demi ouvira falar do grupo pela primeira vez, ela sofria dos dois grandes males que acompanham o sonho de viver em Manhattan: a ausência de homens solteiros e decentes para namorar e a falta de dinheiro.

Mas havia previsto ambos. Como passara a maior parte de seus 25 anos planejando sua fuga para a Big Apple, lera todos os artigos, blogs e livros sobre o assunto, economizara dinheiro com a mesma avareza do Tio Patinhas enquanto fazia faculdade, e até mesmo criara uma poupança à parte para emergências. Demi estava nessa havia muito tempo.

Encontrar o intercâmbio de pratos congelados tinha sido um golpe de sorte brilhante. Das 16 mulheres, 14 também eram solteiras, trabalhavam no East Village e sabiam onde encontrar os melhores happy hours, as lavanderias a seco mais baratas, a operadora de celular que realmente funcionasse e os lugares para não frequentar em um encontro, presumindo que alguma delas já tivera um encontro.

Melhor ainda, Demi realmente havia feito suas primeiras amizades verdadeiras em Nova York.

– Atenção, senhoritas! – Shannon Fitzgerald, uma ruiva natural usando um vestido imitação de grife fantástico que Demi tinha notado logo de cara, precisou gritar para se fazer ouvir. Todas elas estavam de pé ao redor de um retângulo de mesas, seus pratos diante de si empilhados de forma organizada. Todo mundo tinha trazido a própria bolsa térmica com saquinhos de gelo no fundo. Logo, logo elas pegariam os itens, indo de pilha em pilha, formando uma fileira elegante de mulheres trabalhadoras, todas com menos de 30 anos, vestindo algo escuro naquele dia de dezembro. Todas, exceto Demi. Ela havia escolhido uma saia e casaco com estampa xadrez amarela e preta, com mais destaque no amarelo, feitos a mão, seguindo seu próprio padrão de imitação de boas marcas. O qual teria ficado muito bonito em Shannon, agora que Demi pensava no assunto.

– Silêncio – disse Shannon, e, em um momento, a sala ficou quieta. – Obrigada. Eu tenho uma ideia – disse ela.

Não era apenas uma frase. Não da forma como fora dita. Não, todas as palavras vieram em caixa-alta e negrito, como uma manchete de jornal. A ideia ia ser boa. Empolgante. Muito mais do que apenas uma nova receita de prato congelado.

– Para vocês que são novatas – Shannon meneou a cabeça em direção a Demi –, minha família é proprietária de uma gráfica. Fitzgerald & Sons, na Décima Avenida com a North 50th.

Demi tinha visto o lugar. Era enorme.

– Nós fazemos cards. Principalmente esportivos, mas agora muita gente os quer. Artistas usam como cartões de visita, corretores fazem o mesmo. Eles pedem modelos de Twilight, Harry Potter, The Hunger Games, e acabamos de receber um pedido imenso de cartões de visita com o tema hip-hop.

Shannon fez uma pausa, olhando ao redor. Então sorriu.

– Ninguém, no entanto, usa os cartões de visita da maneira como deveriam ser usados: para o comércio de homens.

Demi piscou e lançou um olhar para sua melhor amiga, Rebecca Thorpe, só para encontrá-la retribuindo o olhar. Elas menearam as sobrancelhas uma para a outra, e Demi ficou grata mais uma vez por ela e Rebecca terem se dado bem na primeira troca de pratos congelados, apesar de suas óbvias diferenças. Demi era de uma cidade do interior em Ohio e tinha uma família enorme de classe média. Rebecca era advogada, filha única de uma família rica de Nova York, e administrava uma fundação de caridade, uma das maiores do mundo. Mesmo assim, após cinco minutos de reunião, já estavam fazendo planos, trocando telefones e, na mesma noite, já haviam feito contato nas redes sociais, além de conversado ao telefone durante mais de uma hora. – Intrigante – disse alguém, e Demi fez chacota da “ideia” e do teatrinho. Outra mulher disse:

– Continue.

Shannon ficou grata.

– Há três semanas, saí para um encontro arranjado. Minha prima conhecia um cara que trabalhava com outro cara, e vocês já conhecem o esquema. Ele foi ótimo. Mesmo. Nós nos conhecemos no Monterone… Eu sei, o risoto deles é delicioso… De qualquer forma, ele era bonito, seu trabalho era legítimo, ele fora comprometido, mas tinham terminado alguns meses antes. Foi um encontro às escuras muito bom, um dos melhores que já tive em eras. Mas ela não estava lá. – A ruiva suspirou. – Química zero. Eu sabia, ele também. Entretanto – disse ela, só que foi um “entretanto” –, eu soube de cara que ele e Janice iriam se dar muitíssimo bem.

Todos os olhares se voltaram para Janice. Demi a conhecia, é claro, mas era uma das poucas com quem não tinha saído para beber uns drinques. Ela era uma gracinha também. Alta, morena, sabia se maquiar muito bem.

Janice sorriu.

– Nós saímos três vezes, e ele é fantástico. Não consigo nem acreditar. – Janice pôs as mãos na mesa diante de si e se inclinou sobre as enchiladas de frango congeladas. – Vou conhecer a mãe dele na sexta-feira.

Todas na sala disseram “Ohhh” no mesmo tom.

– Eu sei – comentou Janice de pé novamente. Costas retas, rosto radiante. Como se não bastasse ter vencido o concurso de soletrar e também ter arrasado nas olimpíadas de matemática. Shannon prosseguiu:

– Eles existem, vocês sabem. Homens gentis e bonitos, com empregos estáveis. Heterossexuais, que não são comprometidos ou casados. Combinem isso à gráfica da minha família e vocês terão…

Aquilo era como um espetáculo da Broadway, pensou Demi. Ou o canal de compras da TV. Ela prendeu a respiração, esperando pela revelação, pela ideia em toda sua glória.

Shannon levantou as mãos, segurando um card em uma delas. Um cartão bonito, brilhante. Um cartão de visitas digno de um vencedor do Troféu Heisman, concedito a esportistas, ou de um membro do Hall da Fama.

– Na frente – disse ela –, a foto. Claro. – Então ela girou as mãos. – Nas costas, os detalhes importantes. As estatísticas que importam.

– Tipo…? – disse Demi surpresa por ter falado em voz alta.

– Em primeiro lugar – disse Shannon –, se quer casamento, namoro ou encontro de uma noite.

As mulheres assentiram. Aquilo era extremamente importante. Quantas mágoas poderiam ser eliminadas se soubessem quem era quem. Todos tinham seu lugar. Demi nunca se interessaria por casamento. Provavelmente não por um namoro, apesar de isso depender da situação. Mas um casinho de uma noite? Deus, sim. Alguém pré-selecionado? Seria a perfeição. Uma bela ideia de uma garota de Manhattan.

– O restaurante favorito dele – acrescentou Shannon, e novamente houve um “a-hã” coletivo. – Porque ao passo que eu gosto do pub no fim da rua, algumas de vocês podem preferir comida japonesa. Depois, temos a paixão dele.

Um silêncio se seguiu a tal declaração, mas Shannon o explorou, sem pressa para explicar, embora até mesmo ela tivesse seus limites.

– Vocês sabem tão bem quanto eu que todos eles querem falar sobre si mesmos e, geralmente, me refiro sobre suas coisas.

Não, não àquelas coisas. Quer dizer, as outras preocupações principais que eles geralmente têm. Vocês sabem, o time dos Yankees, ou o mercado de ações, ou o tablet, ou filmes estrangeiros. Se você torce para os Mets, não vai querer se envolver com um especulador da bolsa de valores. Ou talvez até queira, mas pelo menos vai entrar nessa já sabendo o que a espera. E finalmente – disse ela, fazendo mais uma pausa dramática – a última linha. A divulgação completa. O ronco pode não me incomodar, mas pode incomodar você. A química é uma coisa totalmente variável. Mas todas nós merecemos ouvir a verdade absoluta. Uma pesquisa na internet só pode lhe oferecer respostas até determinado ponto, estou certa?

Novamente, houve silêncio, mas não porque alguém estava confuso. A beleza da ideia estava sendo absorvida, estava solidificando, estava florescendo como uma rosa no inverno. Em uníssono, as mulheres do comércio de pratos congelados quinzenal da St. Mark começaram a aplaudir.

Gostosos, preparem-se: estava nascendo ali a Troca de Cartões de Nova York.

COM UMA rápida olhada pela janela para o removedor de neve que atravessava a Rua 72, a oeste, Joe Winslow empurrou a cadeira em seu escritório até o computador número 3. Havia seis no total, cada um rodando um sistema operacional diferente, cada um alternando visualizações de seu grupo de comunicação, Naked New York. Havia equipamentos como aqueles, bem, não exatamente iguais, mas similares o suficiente, em um apartamento no Queens, em um bangalô em Los Angeles, em um apartamento em Londres e em um escritório em Sydney. E havia também a enorme mansão antiga em Delaware, onde a maior parte de seus servidores estavam alojados.

O Naked New York era um desgraçado voraz carente de atenção constante. O que tinha começado como um único blog sobre Manhattan, em 2005, se transformara em dez blogs independentes que geravam, de acordo com a contagem mais recente, mais de 200 milhões de acessos por ano e, muito mais importante, cerca de 30 milhões anuais em receitas de publicidade. O NNY era como qualquer outro conglomerado, só que os produtos comercializados eram ideias e opiniões, palavras e dicas, fotos e fofocas. Sempre mudando para permanecer pertinente o tempo todo. O fluxo de receita era cem por cento gerado por publicidade, e, ao mesmo tempo que Joe pagava uma pequena equipe de funcionários em tempo integral e uma enorme equipe de colaboradores, todos os blogs eram seus bebês, independentemente se focassem em celebridades, finanças, esportes, tecnologia, jogos ou até mesmo a perspectiva feminina sobre a vida. Ele confiava em seus editores, mas era seu nome que aparecia no topo de todas as páginas.

O que por si só tinha transformado Joe em uma celebridade, pelo menos nas cidades importantes. Ele gostava dessa parte. Não tinha pensado nisso quando redigiu o plano inicial de negócios, mas havia coisas piores do que ser convidado para todos os grandes eventos e ter mulheres deslumbrantes ansiosas para acompanhá-lo em todos eles. Não fazia parte da turma de George Clooney, mas a determinação de Joe em permanecer solteiro tinha começado como piada, passado a fato e se transformado em lenda no intervalo de seis anos.

O celular tocou, uma chamada, não um torpedo, e ele atendeu; seu fone com Bluetooth tinha sido colocado no ouvido logo após o banho matinal.

– Naomi. Como vai você hoje, linda?

– Repleta de prazer e satisfação como sempre – respondeu sua assistente com a voz anasalada, típica do sotaque de Brooklyn. O tom era tão seco quanto champanhe brut extra.

Joe sorriu.

– Alguma mudança?

– Não. Só não se esqueça de que o alfaiate virá às 11h. Não o faça esperar. Você fez isso da última vez e, mesmo sendo precioso como um diamante para mim, a lista de clientes dele faria você tremer.

– Você é sempre tão gentil com meu ego. – Joe olhou para o aparelho para verificar quem estava interrompendo sua chamada. Era sua prima Rebecca. Estranho, ela raramente mandava torpedos em dias úteis. – Tenho que correr.

Naomi desligou antes mesmo de Joe botar as mãos no teclado do telefone.

O que houve? Alguém morreu? JW

Um segundo depois, o telefone bipou com uma nova mensagem.

Está tudo bem. Mas tenho uma surpresa pra você.

Joe caminhou de novo, desta vez para verificar as estatísticas de um de seus clientes mais recentes. Os anúncios estavam sendo veiculados em cinco mercados, e eles estavam indo bem em quatro.

Que tipo de surpresa? JW

Um encontro.

Ele riu. Seus polegares voaram pelo teclado.

Pare com isso, Becca. JW

Rebecca era sua prima favorita, o que devia significar alguma coisa, pois ele tinha uma tonelada deles. Seus pais tinham cinco irmãos cada, e eles todos procriaram como coelhos. Joe tinha três irmãos, mas só um optara pela visita da cegonha.

Em vez do sinal sonoro anunciando um novo torpedo, o celular tocou de fato. Joe mudou para o recurso de voz.

– Sério – disse Rebecca. – Acho que você vai gostar muito dela. Ela é… diferente. É nova. Novinha em folha. Ainda usa roupas coloridas, pelo amor de Deus. E é brilhante, baixinha, engraçada e completamente deslumbrada. Ela vai desmaiar em cima de você, e deixar seu ego tão inflado que você não vai ser capaz de passar mais na porta.

– Ah, Rebecca. Eu não sabia que você se importava. Ela soa perfeita.

– Aposto que você não tem compromisso no dia dos namorados.

Joe suspirou.

– Não seja boba. Eu nunca planejo esta data com muita antecedência.

– Desta vez, vai planejar.

Ele desviou o olhar de seu monitor ao ouvir a voz dela. Traquina, como sempre, mas não deixara de notar o desafio. Joe gostava de um desafio, e Rebecca era esperta. Realmente esperta.

– Tudo bem.

– Manterei contato.

– Qual é o nome dela?

– Isso importa?

Ele suspirou, levando as mãos ao teclado. – Não.

Joe desligou e, dois minutos depois, estava imerso em uma chamada em conferência, no Dia dos Namorados e em enigmas intrigantes esquecidos.

DEMI TINHA feito curry de grão-de-bico com legumes e macarrão com queijo para suas refeições congeladas, mas, assim como todas na cozinha imensa, não estava ali por causa da comida. Hoje era o dia dos cartões.

Os últimos encontros para troca de pratos tinham se concentrado mais nos cartões do que na comida. Todas, com uma notável exceção, ofereceram pelo menos dois homens para a lista de cartões de troca. Elas trouxeram fotos, forneceram as informações para colocar nas costas, concordaram que todos os primeiros encontros deveriam ser realizados em locais com bastante público, com a pessoa responsável por apresentar o sujeito ao grupo ciente dos detalhes e dos números de telefone envolvidos. Então Shannon havia criado modelos dos cartões, modificando-os duas vezes até chegar a um design que funcionava. A impressão dos cartões em si não demorou muito tempo, mas o tempo havia se estendido como massa de vidraceiro desde aquele dia em dezembro. Finalmente, um mês e meio depois, ali estava. Havia de fato uma chance, por mais remota que pudesse parecer, de Demi encontrar um cartão que tivesse seu homem ideal na capa, e ele só iria querer uma noite quente que faria a cidade explodir.

Ela não merecia encontrar o sr. Perfeito agora, no entanto. Porque Demi não tinha trazido nenhum homem para ilustrar os cartões. Zero. Nada. Conhecera alguns solteiros na agência de publicidade onde trabalhava, mas nunca tinha saído com nenhum deles. Não que não tivesse sido convidada. Mas almejava subir na empresa o mais depressa possível e não queria criar qualquer vínculo até completar pelo menos um ano lá. Ela podia ser de Ohio, mas não era uma capiau ingênua.

Demi tinha planos. Mais especificamente, tinha um plano de cinco anos. Objetivo: tornar-se consultora de moda, escritora e personalidade televisiva. O plano era sua estrela guia, seu atalho através da loucura de Manhattan. Um dos alicerces do seu plano era que, em nenhuma circunstância, iria se envolver com um homem. Sim, a mocinha tinha necessidades. E tivera alguns encontros desde que se mudara para Nova York, mas poucos incluíram sexo. Demi não sentiu a terra tremer em nenhuma das vezes, o que significava que a ideia de ter uma seleção de homens decentes e já avaliados dispostos a encontros de uma noite só não passara muito longe de seus pensamentos desde dezembro.

Coisa assustadora, já que Demi não tinha muitos amigos em uma cidade como Manhattan. Empolgante também. Mas os homens eram diferentes daqueles de sua cidade natal. As regras aqui pareciam mais… fluidas. Os riscos, mais altos.

Graças a Deus sua condição “sem amigos” tinha mudado, uma consequência da troca de pratos congelados. Já era o bastante, na verdade, ter sido incluída na troca de cartões de visitas, mesmo não tendo contribuído com nenhum partido.

Shannon entrou na sala, e o caos se instalou. Refeições congeladas foram abandonadas sem hesitação quando as mulheres se reuniram em torno de uma mesa vazia. A propensão de Shannon para o teatro a fez levantar a caixa de papelão bem alto só para poder virá-la, cobrindo a mesa com uma cascata de possibilidades práticas, belas, todas de tamanho 9cm x 5 cm em papel cartão revestido, ideal para guardar na bolsa ou carteira como um referência útil, como um ponto focal para os sonhos e desejos.

O olhar de Demi varreu a poça de cartões, os olhos arregalados, a adrenalina bombeando, com esperanças de encontrar alguém bom, mas não bom demais. Alguém tranquilo.

Rebecca apareceu ao lado dela e trombou em seu ombro. Demi olhou para a amiga, mas só para fazer uma careta. Quando voltou a atenção para os cartões, sua respiração parou e, por um momento, o coração fez o mesmo. Havia um único cartão fora da pilha, bem diante de Demi. Nele havia uma foto que fez o coração de Demi acelerar.

Não podia ser. Não era possível. A barulheira causada por suas amigas esmoreceu sob o sibilar do sangue aos seus ouvidos quando ela esticou os dedos trêmulos para pegar o cartão.

Joe Winslow. O Joe Winslow. Tinha que ser brincadeira, uma pegadinha. Ele poderia ter qualquer mulher. Já havia saído com praticamente todas. Por que ele estaria em oferta em pleno porão da Igreja de St. Mark?

– Achei que você fosse reconhecê-lo.

Demi desviou o olhar do cartão para Rebecca olhar mais uma vez. O sorriso da amiga era tão presunçoso, como se tivesse conseguido passe livre na disputada boate The Pink Elephant, mas Demi não conseguiu encará-la por muito tempo. Olhou novamente para o cartão, verificando outra vez. Ainda era Joe Winslow.

– Como?

– Ele é meu primo – disse Rebecca.

– Seu primo – repetiu Demi.

– Isso. Deus sabe que ele é solteiro.

– Ele pode ter a mulher que quiser.

Rebecca riu.

– Sim, mas quando se come lagosta e se bebe champanhe todas as noites, você acaba ficando entediado, você não acha?

Demi balançou a cabeça.

– Nem um pouco. Embora agora eu entenda porque você faz parte da troca de pratos congelados. Nós somos o atum para o seu caviar de sempre, estou certa?

Rebecca descartou a dedução revirando os olhos.

– Acredite. Ele está entediado. E precisa de uma companhia para o dia dos namorados.

Demi deu um passo para trás, para manter o equilíbrio.

– Eu? Eu sou… – Ela piscou quando encarou a mulher que pensava conhecer bem. Elas haviam saído para beber mais do que meia dúzia de vezes, e ela e Rebecca tinham se dado muito bem. Riam muito juntas. Rebecca era alguns anos mais velha do que Demi, dona de uma inteligência impressionante, rica como o rei Creso, mas pé no chão. E muito meiga também. Era um dos mistérios de Nova York que uma mulher daquela estivesse caçando pretendentes, mas Demi conhecia a verdade por trás disso.

– O que você diz, Demi? Não sei onde ele vai levar você, mas é obrigatório ficar bem chique no dia.

– Eu sou de Ohio – argumentou Demi. – Faço minhas roupas. Andar de metrô já é algo chique. Ele vai olhar para mim e rolar de rir.

A mão de Rebecca pousou no ombro de Demi.

– Não faça isso. Ora bolas, isso não é você. Eu não sugeriria isso se achasse que você não dá conta. Eu o conheço desde sempre. Ele é engraçado. É inteligente. Vocês vão gostar um do outro. E além disso, nenhum dos dois quer mais do que um casinho de uma noite. Então o que você tem a perder?

– Ele é, tipo, o rei de Manhattan. O que vou ao menos dizer a ele?

– Chame-o de rei de Manhattan. Ele vai amar você para sempre.

– Eu não quero para sempre. Mas talvez, se as pessoas me virem com ele, mesmo que apenas uma vez, vão se lembrar de mim.

– E haverá fotos – disse Rebecca, seu foco retornando à pilha de cartões. – Sempre tiram fotos de Joe.

– E você? – perguntou Demi. – Achou alguma possibilidade nessa pilha aí?

Rebecca levantou um cartão. O cara era delicioso, mas, quando virou para ler o verso, ficou desanimada.

– Casinho de uma noite só. – Ela jogou o cartão de volta na mesa.

– Talvez não – disse Demi. – Talvez ele só ache que quer um caso de uma noite. – Ela continuava a segurar o cartão de Joe, sabendo que, se mais alguém o quisesse, teria que arrancá-lo de sua mão mortinha e gelada, mas ela pegou o cartão do cara gostoso também. – Ele é músico. Um violinista na Filarmônica. Isso é impressionante. E ele não conheceu você.

Rebecca sorriu quando jogou o cabelo longo e volumoso atrás do ombro.

– Você vai mudar de ideia? Passar a querer casamento e filhos depois de um único encontro com Joe?

Demi riu.

– Não. Mas não significa que não poderia acontecer com outra pessoa.

– Não se preocupe comigo, Kingston. Encontrarei alguém. Vamos cuidar de você primeiro. Noite dos namorados. Eu vou providenciar tudo e passo os detalhes o mais rápido possível.

– Ai, Deus. – Demi olhou para a própria roupa, feita em sua máquina de costura que ficava no closet anexo ao quarto. Uma saia verde-exército forrada, com uma blusa de seda estampada reformada, transformada a partir de uma pechincha num brechó. Meia-calça preta, sapatos pretos de salto, uma fita no cabelo curto. A única coisa que havia custado algum dinheiro de fato eram os sapatos, e eles eram de segunda mão. E se ele quisesse ir ao Pegu Club ou ao The Bunker Club? Todo mundo ia notar imediatamente que ela era uma maria-ninguém que veio do nada, vestindo uns trapos desprezíveis.

– Você tem mais estilo no seu dedo mindinho do que qualquer uma nesta sala. Do que qualquer pessoa no programa Project Runway. Ora, Demi. É isso que você veio fazer em Nova York. É a sua chance de agarrar a cidade pelos cabelos. Você consegue. Eu sei que consegue.

Demi se aprumou.

– Tudo bem. O pior que poderia acontecer seria eu fazer completo papel de boba. E eu já fiz isso muitas vezes. Ligue para Joe Winslow. Diga que ele está prestes a conhecer alguém.

Rebecca riu. Então se inclinou para frente um pouquinho.

– Aconselho a tomar fôlego agora, Demi. Na verdade, acho que deveríamos achar uma cadeira. Venha, querida. Tem um saco de papel ali no balcão. Bom trabalho.

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Fic nova na área.
Espero que gostem.
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xoxo

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