18.10.15

Minha Dupla Vida - Capitulo 2


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AULA DE dança. As luzes, a música, as pessoas de todas as classes sociais fumegando, exatamente como eu.
Só de caminhar no salão minha pressão já baixava e eu me sentia em casa. Aqui, ninguém me julgava. Você pensaria que este lugar estaria lotado de mocinhas de 20 e poucos anos aprendendo pole dance para seus namorados lindos. Mas não era nada disso. As mulheres que vinham para cá muitas vezes eram mais velhas, algumas tinham acabado de ter um bebê, e todas estavam procurando um jeito de sentir-se bem consigo mesmas. Não era apenas o pole dancing que atraía aquela clientela. Era nossa instrutora incrível, Natalie Night, que tinha uma forma de fazer aquela sensação de estranheza ser bem-vinda ali. Ela era a razão pela qual eu voltava, semana após semana.
– Estamos prontas, meninas? – perguntava ela agora, caminhando pelos tapetes vermelhos do estúdio em meio à turma avançada. Vestindo um collant preto simples por baixo de uma camisetinha rosa com o nome de uma banda local, ela ligou a música e se aproximou do poste.
Fui até o meu, também grata por finalmente ser capaz de tirar Joe Fraser da cabeça. O que havia naquele homem para me deixar tão perturbada?
– Vamos fazer nosso aquecimento em um minuto – garantiu-nos Natalie, envolvendo uma perna ao redor do poste para se erguer. – Mas primeiro eu gostaria de falar sobre o movimento que todas nós tivemos problemas para fazer da última vez. Estas suspensões estão nos matando.
Ela escalou o poste rapidamente para demonstrar a técnica adequada, e sabíamos que deveríamos esperar para vê-la, para que explicasse o que fazer. Então, de repente, ela deslizou.
Bam.
A queda aconteceu tão depressa que mal tive tempo de processá-la. Com o coração na garganta, corri até nossa instrutora.
– Natalie? – Fiquei parada olhando para ela, totalmente em pânico. – Você está bem?
Eu estava pirando ao ver a professora de dança mais ágil, linda e talentosa caída no tapete debaixo do poste, a perna inclinada em um ângulo apavorante. Duas alunas estavam atrás de mim, suas múltiplas imagens refletidas assustadoramente nos espelhos que nos cercavam. A melodia do rap pesado ainda tocava nos alto-falantes, e a música que normalmente me animava agora parecia terrivelmente inadequada.
– Acho que devemos chamar uma ambulância – sugeriu uma das mulheres. Era novata na turma avançada, e eu tinha me esquecido do nome dela, mas ela usava um piercing diferente no nariz a cada vez que a via. Hoje era uma margarida roxa.
– Não – respondeu Natalie finalmente, seu único movimento era o esvoaçar das pálpebras cheias de glitter. – Acho que é apenas uma torção no tornozelo, mas me deixem… Deem-me só um minuto, está bem?
– Uma torção? Seu tornozelo parece estar deslocado – murmurei assim que alguém desligou a música. – Eu estava temendo pelo seu pescoço ou sua cabeça. Você caiu tão depressa que não sei dizer o que aconteceu.
Então, novamente, fui distraída por pensamentos em Joe e por minha saída desajeitada após conhecê-lo. Mas Natalie nunca tinha caído. Ela era como uma deusa no estúdio de dança, seu corpo era tão forte e flexível que ela poderia fazer qualquer coisa. Natalie tinha sido minha primeira professora, desde a época em que fiquei morrendo de medo de experimentar aquela modalidade louca em uma festa de despedida de solteira de uma das mulheres com quem eu trabalhava. Eu nem mesmo tinha querido ir para a festa, mas daí fui arrastada por colegas bem-intencionadas para o estúdio contra minha vontade.
Enquanto as outras mulheres no escritório entraram no espírito da dança sexy, eu fiquei travada. Mas Natalie fez eu me sentir bem-vinda, dando-me uma aulinha particular para que eu não ficasse envergonhada. Ela me incentivou tanto que voltei novamente porque, maravilha das maravilhas, eu meio que era boa em dança. E gostei porque não exigia qualquer tipo de habilidade verbal.
Surpreendentemente, continuei dançando. Em particular. Secretamente. Ninguém do trabalho sabia. Mas Natalie fora fundamental para me oferecer esta arena onde me sentia talentosa. Ela ainda era minha professora favorita, mesmo agora que eu já era uma aluna da turma avançada.
– Maldito óleo de bebê – murmurou Natalie de maneira sombria, abrindo os olhos para encontrar meu olhar. – A aula das iniciantes foi aqui, antes da nossa, e alguém provavelmente usou óleo hidratante para o corpo ou coisa assim.
– Caramba. – Quando comecei a dançar no poste, aprendi que qualquer tipo de creme era proibido. A gente quer ficar presa ao poste, não escorregar dele. – Posso levá-la ao hospital assim que quiser.
– Absolutamente não. – Ela segurou minha mão, as unhas perfeitamente manicuradas com estampa de leopardo, um trabalho artístico que deve ter levado algum tempo. – Demi, meu primeiro show no Backstage é hoje à noite.
O olhar urgente em suas íris verde-claras fez eu me lembrar de como aquilo era importante para ela. Natalie estava tentando invadir a cena noturna há meses; no entanto, não era fácil se tornar a estrela de um bom show de dança em uma cidade repleta de atrizes lindas e desempregadas. Mulheres talentosas como Natalie eram contra modelos lindas menores de idade que mentiam sobre os aninhos de vida e que topariam tirar toda a roupa entre as séries de dança para arrecadar gorjetas em clubes de cavalheiros.
Natalie teve uma ideia para um show burlesco, algo elegante, que exigia coreografias vigorosas. Mas ela precisava de alguém para lhe garantir uma “entrada” em um bom clube, a fim de erguer o espetáculo. A casa de shows Backstage lhe abrira espaço para um teste, para fazer uma versão abreviada do show, que destacava o pole dancing. Eu a tinha visto praticar o número, era sexy para diabo sem ser… gráfico.
– Vou telefonar para eles – ofereci, procurando pela minha bolsa de academia, onde eu tinha enfiado meu telefone. Ficaria feliz em ajudar.
No último ano, eu desenvolvera alguma confiança pessoal muito tardia graças àquela mulher. Eu devia a ela.
– Demi, ouça bem. – Ela sentou-se e todas as suas três alunas, eu incluída, nos apressamos para apoiá-la. Ela nos enxotou com a mão, impaciente, porque era uma garota teimosa e forte.
– Estou ouvindo – assegurei a ela, apontando silenciosamente para a máquina de venda automática na parede mais distante, até que uma das outras meninas correu até lá para pegar uma bebida para Natalie. – Só não exagere até você ter certeza de que não vai colocar qualquer pressão nesse tornozelo. Ele já está inchado.
– Vou pegar um pouco de gelo – murmurou a menina do piercing roxo antes de desaparecer.
– Demi. Querida. – Natalie se inclinou para segurar meu rosto, como se eu tivesse 5 anos. Suas pulseiras tilintaram quando ela empinou o queixo até encontrar meus olhos. – Você é uma ótima dançarina.
Envaideci-me um pouco por dentro, meu coração se aquecendo por ouvir elogios de alguém que eu admirava em todos os sentidos.
– É porque você tem sido tão paciente comigo – lembrei a ela, me recordando das noites em que ela havia ficado muito tempo depois de as outras alunas terem saído só para que eu pudesse enfrentar o poste sem tantos espectadores.
– É porque você é muito esforçada e tem uma disciplina que nenhuma outra aluna minha tem.
Preparei-me para dissimular um pouco mais, porque uau. Não tinha habilidades para enfrentar tantos elogios. Pergunte-me sobre meus mecanismos de defesa para a crítica, no entanto, e seria capaz de apresentar relatos completos que narrassem minha experiência, com datas e tudo. Minha mãe, uma famosa decoradora de interiores com um programa próprio de televisão, me dissera muito cedo que eu nunca deveria falar diante de seus clientes, de sua equipe de câmeras ou de qualquer outra pessoa em sua vida profissional porque eu era um constrangimento para ela. Ouvir esse tipo de censura da própria mãe é… prejudicial, para dizer o mínimo.
Mas antes que eu pudesse falar qualquer coisa, as outras alunas retornaram com a água para Natalie e o gelo para o tornozelo dela, o qual apoiamos sobre uma toalha dobrada.
– Meninas… – Natalie virou com expectativa para nós três quando finalizamos nossos esforços de primeiros-socorros. – Preciso de alguém para assumir o número de dança experimental para mim hoje à noite no Backstage.
Ela estava falando sério? Ninguém era capaz de substituí-la.
Lembrei-me de que tinha que pegar meu celular e ligar para o clube em nome de Natalie.
– Demi deveria ir.
– Demi, você tem que ir no lugar dela. – As outras dançarinas falavam ao mesmo tempo, e deve ser por isso que meus ouvidos estavam me enganando.
– Hein? – Eu já estava pegando minha bolsa de ginástica para achar meu celular. – Vou telefonar para o Backstage…
– Você não vai fazer isso. – Natalie pegou meu telefone, aparentemente encontrando-o dentro da bolsa antes de mim. Ela o colocou atrás das costas enquanto me olhava pelo reflexo do estúdio revestido de espelhos. Ventiladores de teto enormes zumbiam suavemente, agitando o ar viciado, vagamente suado.
Meus batimentos cardíacos ficaram ainda mais altos do que quando Joe Fraser apertou minha mão. E aquele gesto estava dizendo algo.
– Você está louca? – protestei. – Você precisa cancelar.
– Esforcei-me muito para conseguir esse teste. – Ela me encarou daquele jeito firme e paciente que outrora me dera a coragem de tentar meu primeiro movimento de borboleta estendida no poste. – Dem, preciso daquele emprego.
Eu sabia que era verdade. O ex-marido calhorda de Natalie conseguira arrastar o divórcio nos tribunais apenas por tempo suficiente para limpar todas as economias dela. Seu emprego como instrutora de dança provavelmente pagava algumas contas, mas Los Angeles era uma cidade cara. Natalie fora às alturas de satisfação quando conseguira marcar a apresentação com o dono do clube.
Uma bola de medo se retorcia em meu estômago.
– Vou estragar tudo para você – sussurrei quando o suor começou pingar em minha testa.
Minhas colegas de turma discordaram de mim, se intrometendo para apoiar Natalie, mas eu não conseguia distinguir as palavras delas. Todo meu foco permanecia em minha amiga e naquele olhar que parecia sugerir tolamente que eu era capaz.
– Prefiro perder dessa maneira do que simplesmente telefonar e cancelar. Pelo menos, se você fizer o número por mim, vou ter uma chance. Assim que a temporada começar, no outono, meu tornozelo vai estar melhor. – Natalie tirou a franja de cima dos meus olhos. – Tenho uma peruca loira que você pode usar. Vai ser como atuar. Só que sem nenhum diálogo para recitar.
O grande problema da minha amiga querida era que ela sabia exatamente os pontos que deveria pressionar. E Natalie estava perfeitamente consciente de que uma das maneiras com que me convenci a permanecer fazendo pole dancing foi assumindo uma nova personalidade sempre que pisava no estúdio. Quando chegava aqui, não era mais Demi Masterson, analista financeira.
Transformava-me em uma pessoa completamente diferente. Alguém capaz de se perder no ritmo do rap e nos movimentos de pole dancing.
Nesse momento, quase consegui imaginar que uma peruca iria me ajudar a enfrentar a coisa toda caso eu substituísse Natalie no teste. E vamos encarar: não importava o quão insegura eu estivesse, não podia dizer não para a pessoa que me dera o dom da dança, para começo de conversa. Meu desempenho seria um desastre, e eu definitivamente faria papel de idiota.
Mas por Natalie, iria pelo menos tentar.
– Quero a peruca – falei finalmente. – E todo mundo aqui deve jurar segredo, certo? Vou ser demitida se alguém…
Qualquer outra coisa que eu pudesse ter acrescentado, outras condições e um rol de preocupações, se perderam em um abraço esmagador quando as mulheres em torno de mim gritaram e prometeram levar meu segredo para o túmulo.
Droga.
– Só gostaria de saber uma coisa. – Sabia que provavelmente iria ficar enjoada antes de dirigir para o Backstage, que era do outro lado da cidade. – A que horas devo ir para lá?
O PRIMEIRO espetáculo começa às 23h. Joe olhava para o relógio enquanto aguardava seu cliente terminar de alimentar o cão, o peixe e as duas cobras que estavam enroladas em uma gaiola apoiada na mesa da sala de jantar da casa de praia de Malibu do sujeito.
Joe sabia muito bem que Eric Reims iria tentar escapar daquele passeio, a menos que ele aparecesse para arrastá-lo pela orelha. Joe vinha dizendo ao ator há três meses que ele precisava aparecer mais aos olhos do público, ficar na rua até tarde e provocar algumas cenas, porém o sujeito nunca obedecia. Eric era jovem demais para ser um tipo tão caseiro, mas era um daqueles artistas cuja personalidade só se ressaltava diante das câmeras. Durante o restante do tempo, estava muito mais para um observador discreto da vida.
No entanto, como tantos outros atores, Eric se deu mal quando Thomas interrompeu a continuidade do filme dramático e emocionalmente sombrio que Joe planejara, causando estragos na credibilidade de Joe no ramo e destruindo seus laços profissionais. Para fazer as pazes, e em um esforço para manter sua reputação, Joe entrara no negócio de gestão de talentos há seis meses somente para reposicionar todos aqueles atores de volta ao mercado de trabalho. Metade dos talentos afetados já estavam bem direcionados, mas Joe jurara que iria encontrar um papel para cada um dos novos jovens rostinhos que tinham se vinculado ao projeto. Sendo assim, sua agência de talentos era coisa recente, porém Joe era dedicado para diabo e, um por um, ele iria encontrar papéis para seus clientes. Claro, seu sobrenome famoso ajudava.

Ele não se importava com o que a imprensa pensava a seu respeito com a mesma intensidade com que se preocupava com sua dívida para com o elenco do filme que nunca chegara a fazer. Uma vez que cumprisse seu intento, encerraria a empresa de gestão de talentos e seguiria para a próxima fase: abrir o próprio estúdio independente nos próximos meses. Ele ainda detinha os direitos sobre o filme que engavetara quando era produtor no estúdio do pai e tinha todas as intenções de fazer o tal filme. Mantendo o tipo de integridade artística que imaginara desde o início.
– Estou quase pronto – disse Eric do aquário que dividia a sala de bilhar da sala de jantar. – Gostaria de pegar a primeira apresentação da noite para poder chegar em casa mais cedo.
Joe serviu-se de uma bebida no bar ao lado da mesa de sinuca, tentando se concentrar na casa reformada de seu cliente em vez de no potencial problema profissional que certa analista financeira da Sphere Asset Management lhe criara. Ele devia estar incomodado por ter seus assuntos particulares fuçados e, até certo ponto, estava mesmo. Mas outra parte dele simplesmente queria vê-la novamente.
Não era preciso ser um gênio para descobrir qual parte.
– Você tem 26 anos. – Joe se obrigou a se concentrar em seu cliente. Ele serviu uma bebida para Eric também, notando que o sujeito precisava relaxar. – Por que você precisa estar cedo em casa? Os peixes não vão dar festas de arromba enquanto você estiver fora.
O pai de Eric era um ator de primeira linha, mas o velho não ajudara o filho no ramo. Joe se identificou imediatamente. Além disso, ele gostava de Eric por seu talento e sua ética profissional, embora o outro não tivesse nenhuma noção sobre o ramo do cinema.
– Clubes de striptease não são… meu ambiente.
Joe imaginava que aquilo fosse um eufemismo, a julgar pelas prateleiras e mais prateleiras de livros que cobriam a sala de bilhar. Se Eric tivesse lido sequer uma fração deles, devia pelo menos passar um bom tempo com um livro na mão.
– O Backstage não é um clube de striptease… está mais para um local de dança exótica. Um monte de dançarinas de sucesso começaram lá. – Detalhes insignificantes, talvez. – Embora, com toda sinceridade, as apresentações fiquem mais ousadas conforme a noite avança.
Assim ele ouviu dizer.
Pegando sua bebida, Eric sorriu.
– Você não estaria me arrastando para lá se o lugar tivesse uma reputação ilibada.
– Ei, dei a você oportunidades de sair e fazer loucuras sozinho, cara. – Joe tilintou seu copo contra o do amigo antes de virar o resto da vodca gelada que ele havia encontrado no congelador do frigobar. – Agora você está preso comigo, porque preciso que você apareça no radar de mais alguns agentes de elenco, e este passeio vai ajudar.
– Você não precisa ir comigo, cara. Dessa vez eu vou mesmo para lá. Sério. – Eric fez uma careta depois que bebeu sua dose.
– Não é que não confie em você, mas vou junto. – Ele ia mandar Eric para um teste na semana seguinte e queria colocar o rosto do sujeito nas páginas das revistas de fofocas de celebridades. Era decisivo fazer a coisa toda na época certa. – Preciso que você consiga o papel principal na semana que vem.
– Quando você coloca dessa forma… – Eric ajeitou a gravata. – É melhor eu ir.
– É isso aí. – Joe colocou o copo sobre o balcão e pegou o celular. – O carro está nos aguardando, então vamos.
Quarenta minutos e muito tráfego de fim de semana depois, chegaram ao Backstage, onde as batidas graves ressoavam tão alto que o som vibrava até nos sapatos de Joe. Ele estava a poucos metros atrás de Eric quando passaram pelas cordas de veludo da entrada VIP. Uma fila considerável tinha se formado à entrada principal, mas não havia ninguém diante das cortinas da entrada VIP, exceto o segurança com uma lista de convidados.
Não havia paparazzi ali, mas isso não importava. Eric tinha participado de alguns filmes para adolescentes altamente reconhecíveis. Bastaria que algumas pessoas o reconhecessem e começassem a tirar fotos ou a fazer vídeos com os celulares. Diabos, até mesmo as dançarinas faziam isso nos intervalos, então era uma prática bastante comum. Joe só precisava manter seu cliente ali durante algumas horas, para se certificar de que o sujeito iria aparecer nos blogs de fofoca no dia seguinte. Após isso, a história se escreveria por si só e rumaria para os tabloides maiores; em duas semanas, Eric de repente passaria a ser visto como um playboy de Hollywood.
Diretores de elenco iriam cair de amores por uma imagem totalmente nova. Joe só esperava que ele próprio não fosse pintado com a imagem de bad boy também. Esse tipo de coisa não apenas era uma distração, como ele também não precisava de mais atenção da imprensa esses dias.
– Entrem, Sr. Fraser. – O segurança já foi abrindo a corda de veludo. Ele usava um fone de ouvido e ajustava o microfone enquanto falava baixinho nele, sem dúvida solicitando assentos na primeira fila.
Como de costume, Joe lutava contra a velha culpa pela forma como seus caminhos muitas vezes tinham sido pavimentados pelo pai. O segurança o teria reconhecido como um Fraser, não por causa de sua agência de talentos incipiente e, definitivamente, não por causa dos filmes que ele ajudara a fazer com nenhum crédito de produção. Seu pai insistira que Joe se daria melhor se forjasse seu próprio caminho no mundo, de modo que tivera o cuidado de não lhe oferecer qualquer reconhecimento profissional.
– Obrigado. – Joe deu uma gorjeta ao segurança assim que entraram, a batida rap ousada tomando o lugar da música lenta que estava tocando momentos antes.
Joe registrou com satisfação que várias cabeças se viraram quando eles passaram pelo corredor principal em direção a assentos tão próximos dos espetáculos que poderiam tocar o centro do palco. Aparentemente, Eric já tinha sido reconhecido. A maior parte do trabalho estava feita, então Joe se acomodou para assistir ao primeiro show. Ele poderia pesquisar discretamente sobre Demi Masterson em seu celular, afinal precisava confrontá-la no dia seguinte bem cedo.
No entanto, um olhar para a loira que se encaminhava para o centro do palco o fez enfiar o telefone de volta no bolso.
Maravilhosa. Droga.
E ele não era do tipo de cara que gostava das “maravilhosas”. E principalmente não das mulheres que dançavam em lugares como o Backstage, onde as artistas legítimas se misturavam às mulheres que o fariam pagar por qualquer coisa na sala VIP, caso tivesse um belo saldo bancário. Os gostos de Joe eram um pouco mais refinados, afinal ele preferia impulsionar uma mulher ao frenesi sexual por ambos estarem no clima, e não porque ele havia pago por uma dança particular.
No entanto, algo na artista que se empinava no poste de dança iluminado pela luz estroboscópica o fez sentar-se ereto. Ela usava um traje de tecido fino com plumagens prateadas estrategicamente colocadas sobre os seios e formando um V em torno dos quadris. Cabelo platinado e liso roçava os ombros, o brilho lustroso e a franja perfeita fazendo-o pensar ser uma peruca. Uma máscara preta e prateada cobria a metade superior do rosto dela, mas Joe conseguia notá-la dando piscadelas para o público através dos buraquinhos.
Ele nem sequer piscava enquanto ela acariciava o poste prateado com uma das mãos e girava em torno dele usando um par de sapatos de salto agulha sedutores. O que havia nela que o fascinava tanto?
– Muito bom. – A voz de Eric ao lado dele o irritou, em parte porque, em sua concentração na dançarina, ele se esquecera de que seu cliente estava lá. Mas ainda mais porque tinha se esquecido de que não era o único a babar em cima da mulher.
O que tinha dado nele hoje? Primeiro a atração perigosa pela tímida analista financeira, e agora isso? Obviamente Joe tinha colocado o sexo tão em segundo plano em sua vida até agora, que sua libido estava fazendo algum tipo de piada à sua custa.
– Pensei que clubes de cavalheiros não fossem seu tipo de lugar – rebateu Joe, tenso de repente.
– Eu definitivamente imaginei algo muito mais suado e brega. – Eric deslizou uma nota de cem dólares para o palco, a poucos metros de onde a loira agora escalava o poste com a graça ágil de um gato selvagem. – Mas dançar desse jeito exige treino. Ela é boa.
Joe cerrou os dentes. Ele devia estar feliz por Eric estar se encaixando. Melhor ainda: uma jovem mulher de braço dado com seu namorado distraído estava mirando um celular na direção de Eric; sendo assim, o cliente bonzinho de Joe tinha acabado de ser filmado dando uma gorjeta a uma dançarina exótica. Aquilo era exatamente o que ele desejava quando planejara aquela saída.
Mas isso foi antes de ver a dançarina em questão.
Inexplicavelmente incomodado, Joe se obrigou a pegar o celular no bolso e pesquisou algumas informações básicas sobre Demi Masterson. Ele continuava a observar discretamente a loura que se arqueava no poste, mas talvez isso se desse apenas porque ela se assemelhava levemente à analista financeira. Mesmo de máscara, a estrutura óssea do rosto parecia semelhante, pelo que ele se lembrava.
Não que ele a estivesse avaliando ou coisa assim.
Aquele pedacinho de negação terminou quando a dançarina se pendurou de cabeça para baixo usando uma perna só, o rosto quase alinhado aos olhos dele. Os olhares de ambos se encontraram por um instante longo e sexy.
Pouco antes de ela lhe soprar um beijo.
OBVIAMENTE, PERDI a cabeça.

Assim que o beijo deixou meus lábios, quis pegá-lo de volta. Estava cortejando o desastre em todos os sentidos possíveis, flertando com um cliente sensual enquanto estava pendurada de cabeça para baixo por uma perna só. Conte comigo: uma só.
Foi uma surpresa não ter quebrado um braço ainda. E sabia com certeza que iria ser demitida da minha empresa conservadora de gestão de riscos caso alguém me reconhecesse. Mas havia entrado na Zona de Dança. Um lugar onde nada podia me tocar, e eu era uma deusa da dança sexy e desejável. Era uma ficção necessária para enganar meu subconsciente, para me fazer enfrentar aquela noite estressante e assustadora.
Precisava disso para conquistar o emprego que Natalie merecia. E havia ainda a vantagem extra de aquilo me fazer sentir como se Joe Fraser tivesse me notado de um jeito que nunca notaria nos escritórios da Sphere, ainda que por alguns momentos.
– Isso, gata – berrou um homem aleatório do fundo do salão, fazendo-me perder a concentração durante minha elevação de super-heroína.
Outro cara assobiou.
Senti um aperto no estômago quando me recordei de que era uma impostora. Será que a pessoa que assobiou estava sendo sarcástica? Enquanto eu estava obcecada sobre tal possibilidade, errei o movimento seguinte e escorreguei no poste.
Não!
Em pânico, meus olhos se voltaram para Joe. Um Joe sensual, másculo, lindo. E ele ainda me olhava como se… Uau.
Senti-me perturbada e sexy novamente.
Então dominei totalmente o movimento seguinte, uma coisa meio lagarta invertida que levei um mês inteiro para dominar. Senti-me uma exibida, flexionando os músculos esguios para benefício de Joe, arqueando e me envaidecendo abertamente. Ver a expressão dele me fazia lembrar por que as mulheres aprendiam danças provocantes, para começo de conversa.
Para seduzir os homens.
Vê-lo me observando era mais excitante do que qualquer coisa que eu já havia experimentado. A coreografia de Natalie não envolvia a retirada de qualquer peça de roupa, pois o traje já era diminuto o suficiente, para começar, mas fiquei tão excitada por causa dele, que consegui me enxergar tirando a roupa para aquele sujeito.
Queria os olhos dele em mim o tempo todo. Queria deixá-lo com água na boca, com o corpo ávido.
A torcida e os gritos da multidão me incentivaram quando desci do poste, aterrissando em uma pose elegante antes de me arrastar de quatro até a beira do palco.
Bem diante de Joe.
As narinas dele inflaram. A mandíbula enrijeceu. Dava para ver o peito dele subindo e descendo com a força da respiração.
Fiz um showzinho lento ao ficar de pé, jogando o cabelo e rebolando lentamente. Agia por instinto, quase sem saber o que estava fazendo. Aquilo era gostoso.
Agora eu me virava para dar as costas a Joe. Mãos nos quadris, arqueei a espinha para lhe oferecer uma boa visão das lantejoulas prateadas da cava da calcinha que mostravam meu… lado atrevido.
Joguei o cabelo uma última vez e olhei por sobre o ombro. Dessa vez não apenas mandei um beijo. Dei um tapinha na nádega e a multidão foi à loucura.
O estalo me trouxe de volta à realidade. O que eu estava fazendo?
Envergonhada, agora que a música tinha acabado, senti minha showgirl interior me abandonando. De repente era só eu, Demi Masterson, sozinha no palco com uma peruca loira e máscara de pateta.
Lançando um último olhar a Joe, notei que o feitiço também tinha acabado para ele. Ele ainda olhava para mim, mas não estava mais na beiradinha da cadeira. Ele conversava com o sujeito ao lado, um ator que eu provavelmente deveria ter reconhecido.
O que me fez pensar: será que Joe Fraser tinha ficado atraído por mim?
Saindo do palco apressadamente, quase virei meu tornozelo ao descer as duas escadarias que levavam para a área de camarins. Só para descobrir que Joe tinha chegado lá antes.
O homem dos meus sonhos estava de pé entre mim e meu retorno à minha vida normal e entediante. Será que ele me reconheceu? Eu não podia nem mesmo perguntar a ele, porque se o fizesse, minha língua ia travar, assim como ocorrera no escritório, e eu iria me delatar, com certeza. Agora, mais do que nunca, eu não podia deixar minha gagueira me dominar. Eu usaria algumas das técnicas de discurso que havia aprendido: fale depressa, fale devagar, fale suavemente, qualquer coisa para contornar aquele maldito obstáculo travando minhas palavras.
Infelizmente, quando encarei as feições bem delineadas e o rosto megamásculo de Joe Fraser, fiquei mais nervosa do que jamais estivera em toda minha vida.

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Mais um capítulo :)
Estão gostando?
xoxo

5 comentários:

  1. Pq vc parou??? Justo agora que ficaram cara a cara..... socorrooo..... continuaaaa......

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  2. Estou adorando :) Agora está mesmo a ficar emocionante, ele foi ter com ela...

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  3. Amando. Não podia ter parado ai... Posta mais!!!

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  4. Menina continua que fic babado ja to apaixonada por ela posta logo

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  5. Posta please!! Estou surtandoooooo....

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