10.7.14

Blackout - Capitulo 2

 
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– VOCÊ ESTÁ um desastre. – Joe Jonas colocou a bolsa da câmera sobre uma poltrona alaranjada de vinil num cantinho privado da sala de Wilmer, e sentou-se na outra.

Moreno, bonito, extrovertido e dono de um senso de estilo que sempre o fazia parecer saído direto das páginas de uma revista de moda, Wilmer fazia pescoços virarem no meio da multidão. Uma garota da faculdade certa vez comparara os dois amigos aos deuses Apolo e Hades. Eles eram contrastantes, tanto em visual quanto em personalidade. Wilmer, alegre e extrovertido. Joe, sombrio, calado, reservado.

Wilmer, porém, soara cansado e preocupado ao telefone quando pedira a Joe para ir lá. A aparência dele estava tão ruim quanto o tom ao telefone. – O que há?

Wilmer se empoleirou na beirada da mesa de aço inoxidável, com uma perna pendendo.

– Somos amigos há muito tempo.

Joe assentiu diante do óbvio.

Desde que se conheceram em uma turma iniciante de fotografia no início do ensino médio, descobriram um amor mútuo por arte, e uma amizade que resistiu aos anos. Wilmer foi a tábua de salvação que poupou Joe de se afogar na própria solidão. Por outro lado, Joe foi uma âncora para Wilmer, dando a ele uma estabilidade muito necessária. Os pais de Wilmer eram calorosos e extrovertidos, porém volúveis.

Joe não saberia dizer se teria seguido a carreira na fotografia se Wilmer não houvesse acreditado nele e o incentivado. E Joe apresentara contatos valiosos quando Wilmer resolvera abrir uma pequena galeria.

– Você é o irmão que eu nunca tive, e sabe disso – continuou Wilmer. – Sempre achei que poderia lhe contar qualquer coisa. Compartilhar qualquer coisa.

Em determinada época, Joe se sentira da mesma forma. Até descobrir que havia situações e fatos que não podia compartilhar com seu melhor amigo. Como o de estar apaixonado pela noiva dele.

– Espero que você sempre seja meu amigo.

Joe suspirou diante da tendência de Wilmer ao melodrama. Se Wilmer não tivesse aproveitado sua graduação em história da arte e o dom artístico montando a própria galeria, sem dúvida poderia ter se dedicado à Broadway.

– Wilmer, a menos que você tenha assassinado uma velinha a machadadas, sempre serei seu amigo. – Joe deu de ombros. – Bem, acho que seria seu amigo até mesmo nesse caso. Por que simplesmente não me conta o que está acontecendo?

– Eu sou gay.

– Certo.

Primeiro Wilmer telefonou e fez um grande discurso sobre a amizade. Agora fazia piada quando Joe tinha uma sessão de fotos agendada para dali a 45 minutos. O senso de humor de Wilmer era distorcido, e sua noção de timing, péssima.

Wilmer entrelaçou as mãos.

– Isto não é brincadeira. Estou falando sério. Eu sou gay.

Joe ficou sentado, aturdido. Wilmer era… gay? Como isso era possível? Eles eram melhores amigos fazia mais de uma década. Joe era o hétero esquisitão em uma profissão que atraía homossexuais como um míssil teleguiado; no entanto, nunca suspeitara, nem uma vez, de Wilmer e sua heterossexualidade flagrante.

Pelo amor de Deus, Wilmer estava noivo de Demi, dormia com ela regularmente e acabara de anunciar que era gay?!

– Quando… como…

– Talvez bissexual seja uma estimativa mais adequada. – Wilmer passou as mãos com unhas manicuradas pelo cabelo preto curto. – Eu me flagrei incrivelmente atraído por homens ao longo dos últimos anos. – Balançou a cabeça e ofereceu uma risada áspera, isenta de alegria. – Não se preocupe. Você não foi um deles.

Sendo muito sincero, Joe não dava a mínima se Wilmer sentia atração por ele ou não. Bem… talvez estivesse um pouco aliviado por seu amigo não ter professado amor infinito ou desejo por ele, mas sem dúvida deixara algo passar.

Joe se lembrava muito bem da primeira vez em que vira Demi. Fora na galeria, em frente ao escritório de Wilmer. Joe aparecera durante um evento particular, uma festa e exposição privada que Demi havia organizado para sua empresa. Ela estava absorta em uma discussão exaltada com o fornecedor. Uma simples olhada nela e o mundo dele ganhou um foco mais nítido.

Em seguida, Demi desapareceu, e ele procurou por Wilmer, com a intenção de descobrir quem ela era, só para ficar sabendo que Wilmer chegara na frente. Antes que Joe pudesse abrir a boca, Wilmer anunciara que havia conhecido a mulher de seus sonhos e conseguido um encontro com ela. A intuição de Joe lhe dissera se tratar da mesma mulher. E acertara.

– O que foi aquilo há seis meses, quando você disse que tinha acabado de conhecer a mulher de seus sonhos, Elliott?

– Ela era quente e sensual, e tão diferente das outras mulheres em Nova York que pensei que pudesse me curar.

Ela fora usada como uma maldita cura?

Joe se levantou e foi até a janela que dava vista para a rua, necessitando olhar para algo que não fosse o amigo, a quem nem tinha certeza se conhecia mais. Wilmer sempre fora um pouco egocêntrico, mas isso…

Lá fora, habitantes de Manhattan compartilhavam a calçada com turistas. Clientes se aglomeravam desde a loja de eletrônicos do outro lado da rua, passando pela barraquinha de faláfel na esquina até as lojas pelo caminho. Um taxista desviou de uma van de entregas que o cortou.

Como se fosse uma tira de negativos diante de si, Joe enxergava as fotos em sua mente, momentos no tempo comprometidos à memória. Ele apostara que quanto mais tempo passasse perto de Demi, mais conhecesse a respeito dela, mais a atração iria diminuir. Em vez disso, a cada encontro sentia-se mais atraído por ela, descobrindo que sua personalidade, sua inteligência e coragem eram ainda mais profundas e certeiras do que sua beleza física.

E então afastou-se ainda mais. Temendo trair-se com uma olhadela descuidada, com um comentário equivocado, ele se escondeu atrás de comentários sarcásticos. Ainda tinha esperanças de que se recuperaria, mesmo depois de Wilmer tê-la pedido em casamento. Joe conseguiria esquecê-la.

Foi no dia da sessão de fotos, aquele que ele passou fotografando Demi, a pedido de Wilmer, que Joe soube estar profunda e irrevogavelmente apaixonado por ela. Agarrou o parapeito da janela e oscilou sobre os calcanhares, olhando para dentro em vez de focar na rua movimentada abaixo. Foi a única vez em que ficara a sós com ela, e Joe vislumbrara algo tão doce, tão ilusório que ao fim daquele dia sentira algo que beirava a dor física.

E Demi servira apenas como uma maldita cura para Wilmer.

Joe se virou para encarar o amigo, esforçando-se para manter um tom sereno.

– E pedi-la em casamento foi parte da cura ou você se considerou curado naquele momento? Estou um pouco confuso. Isso é algum programa de 12 passos, como no Alcoólicos Anônimos?

– Por acaso você se sente bem sendo esse canalha sarcástico?

– Não exatamente. – Joe experimentou uma ânsia estranha de bater a cabeça de Wilmer contra a parede marrom-escura. – Você a pediu em casamento sabendo que se sentia atraído por homens?

Wilmer corou diante da censura de Joe.

– Mas eu também sinto atração por ela. Achava que, se me entregasse o suficiente ao relacionamento, esses sentimentos iriam desaparecer. – Ele ficou de pé, enfiou as mãos nos bolsos e começou a caminhar pelo cômodo.

– Mas não desapareceram. E você traiu Demi?

Wilmer aprumou os ombros, na defensiva.

– Só uma vez. Ontem à noite. Você conhece Richard, o pintor de quadros com tinta acrílica que estamos lançando? Eu o flagrei olhando para mim, me observando algumas vezes. De qualquer forma, ficamos trabalhando até tarde ontem à noite, dividimos uma garrafa de vinho e uma coisa levou à outra.

Talvez fosse um engano enorme, o qual Wilmer estava expondo além das proporções por causa da culpa. Wilmer também tinha um pouco de dramaturgo, e a culpa era capaz de distorcer a mais nítida das situações, como Joe bem sabia.

– Vocês beberam vinho demais? Estavam bêbados?

Com os olhos castanhos solenes, Wilmer balançou a cabeça.

– Não. Seria um pretexto fácil. Eu não estava bêbado, e sim curioso. Pensei em experimentar e me certificar do que sentia, de um modo ou de outro. – Passou a mão na testa. – Eu gostei. Sinto alguma coisa por Richard.

Joe reprimiu uma careta de desgosto. Aquilo não devia ser diferente de ouvir Wilmer falando de uma mulher.

Mas era. Completamente diferente. Joe ergueu uma das mãos.

– Não quero e não preciso dos detalhes.

– Eu não ia dar detalhes. Foi apenas a título de esclarecimento. – Wilmer meneou a cabeça, um tanto ofendido. – Preciso contar a Demi. Ela merece saber.

– E como merece. – A preocupação, tanto com Demi quanto com Wilmer, deixaram seu tom mais ríspido: – Espero que você tenha usado preservativo.

– É lógico que usei. – Wilmer se jogou em uma poltrona e apoiou a cabeça no encosto. – E esse é só um dos motivos pelos quais preciso contar a ela. Se continuarmos juntos…

O punhal foi retorcido no âmago de Joe.

– Ela precisará tomar uma decisão consciente.

– Você gosta de sexo com Richard, mas vai dormir com Demi? – indagou Joe.

Wilmer amassava uma folha de papel entre os dedos.

– Eu a amo. Como não amar? Demi é sensual, inteligente, calorosa e generosa. Mas não estouramos fogos de artifício no quarto. Sinto atração por ela, mas não é tão excitante quanto estar com Richard.

Wilmer acabara de lhe oferecer muito mais informações em diversas vertentes do que Joe jamais quisera saber. E estava enlouquecendo Joe, brincando com aquele pedaço de papel.

– Dá para largar essa folha?!

Wilmer o fuzilou com o olhar, porém largou o papel sobre a mesa.

– Quer dizer que você não quer romper o noivado? – questionou Joe, a cabeça começando a latejar de tensão.

– Não sei. Demi é uma mulher incrível. Preciso de tempo para pensar. Acho que se rompermos o noivado, será por decisão dela. – Passou a mão pela nuca. – Será uma conversa terrível – Wilmer respirou fundo e depois bufou. – Ajude-me a contar a ela.

– Não.

Aquilo era entre Wilmer e Demi. E falando em conflito de interesses… Joe a desejava, mas não com um coração partido ou como uma amante se recuperando de um baque. No entanto, e l e estaria disponível se aquilo terminasse como achava que iria terminar.

wilmer apoiou as mãos na mesa e se inclinou para Joe.

– Por favor. Preciso de você para me dar apoio moral. Essa vai ser uma das coisas mais difícieis que já fiz.

Wilmer odiava encarar tarefas complicadas sozinho. Desde que ambos se conheceram e se tornaram grandes amigos, ele arrastava Joe consigo para encarar professores, tutores, seus pais. Wilmer sempre afirmava que Joe era mais forte que ele. Mas pela primeira vez Joe não seria envolvido nas confusões de Wilmer. Dessa vez o amigo iria sozinho.

Ele balançou a cabeça.

– Isso é assunto particular, Wilmer.

– Você estava lá quando eu a pedi em casamento – argumentou Wilmer.

Joe cruzou os braços.

– Se eu soubesse que você iria pedi-la em casamento, não teria estado lá.

Extrovertido e doido por uma plateia, Wilmer escolhera um encontro em dupla para fazer a proposta. Joe se recordava do sofrimento que o rasgava enquanto Wilmer presenteava Demi com um anel de ouro e diamante na hora da sobremesa. A mulher que acompanhava Joe, Lenore, achou muito romântico.

– Isso está uma confusão. Preciso de você comigo quando eu contar a ela. Telefonei e pedi a Demi para eu ir lá depois que a galeria fechar. – Wilmer, que àquela altura caminhava de um lado para o outro, estacou e encarou Joe, o comprimento da sala separando os dois. – Falei para Demi que você estaria lá também.

Joe esmagou a ânsia adolescente de perguntar a Wilmer o que Demi dissera sobre o fato de que ele também iria estar presente.

Joe e Wilmer sempre se apoiaram.

Sempre cuidaram um do outro. Mas ele não tinha certeza se seria capaz de suportar ver a dor e a sensação de traição estampadas no rosto de Demi. Nem se tinha o direito de testemunhar esse momento.

– Você não devia ter feito isso.

– Por favor, Joe.

Bem, Joe não vinha sendo um bom amigo para Wilmer quando todas as noites em que jazia em sua cama solitária e fazia amor com Demi em sua cabeça. Sua consciência o espicaçava. Aquilo não era de sua conta, ele não queria ir, mas devia a Wilmer – soubesse ele ou não –, por todos os pensamentos libertinos que tivera com Demi. Por todas as vezes e todos os jeitos que a possuíra em sua mente.

A culpa era capaz de controlar os homens… e obrigá-los a concordar com coisas das quais, de outro modo, estariam fugindo.

– Tudo bem. Eu vou. Mas terei que encontrar vocês lá. – Joe se levantou a pegou sua bolsa com o equipamento fotográfico.

Wilmer tornou a desabar na poltrona, o alívio evidente.

– Às 21h. Na casa dela. Lembra-se do caminho?

Joe deixara Demi em casa com Wilmer, certa vez.

– Claro. – Ele jogou a bolsa sobre o ombro e se virou para a porta.

– Joe? – Ele tornou a se virar para encará-lo.

– Você é o melhor.

Ahã… Quem mais merecia esse título senão um homem que estava obsessivo e compulsivamente apaixonado pela namorada de seu melhor amigo?
 
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Começando a maratona agora!!!

Um comentário:

  1. Eu ainda n parei de rir com a revelação do wilmer, eu estou a rir que nem uma retardada hahahhahahahahaha. E esse joe safado que tem os mesmos pensamentos aliás fantasias que a Demi? ???? Hahaha amei poste lg kiss :*

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